“… doces são os frutos da adversidade” (Shakespeare).
Crianças experimentam dor desde idades muito precoces, por serem filhos de pais severamente neuróticos, deprimidos, drogadictos ou delinqüentes. Crianças vivem altos níveis de estresse, por serem filhos de famílias que viveram separações litigiosas e traumatizantes, que sofreram severos problemas econômicos. Crianças se sentem desorientadas, perdidas numa época tão rica de estímulos, mas tão pobre em ética, princípios e valores. Entretanto, desses grupos, onde o que prepondera é o sofrimento, emergem crianças altamente resilientes. São crianças que confrontaram adversidades, que transformaram perdas em desafios, que lutaram e venceram e que se curaram sozinhas. Parecem ser crianças que quanto mais feridas, com mais força se afirmam no mundo e crescem como adultos resilientes. Resiliência é um conceito que foi emprestado da Física, onde é entendida como a propriedade que têm os metais de resistir a golpes e de recuperar sua estrutura interna. Do ponto de vista das Ciências Humanas, resiliência é a capacidade universal de superar as adversidades da vida e de ser fortalecido por elas. É parte do processo do crescimento e pode ser promovida desde o nascimento. Os estudos sobre resiliência datam das últimas décadas, porém a idéia de resiliência é quase tão antiga quanto o mundo. A luta pela sobrevivência entre os pobres e oprimidos, em todos os tempos e lugares, gerou certa forma de resiliência. O fenômeno da resiliência evoca os velhos mitos de heróis invulneráveis. É um fenômeno encontrado na mitologia, na história, na arte, na religião. São exemplos de resiliência, entre muitos outros, a vida e a obra de Jean Piaget, Máximo Gorki, Aleijadinho. Outro exemplo notável pode ser visto no diário de Anne Frank. Uma jovem, aos 12 anos, condenada a viver escondida com sua família, para tentar escapar à perseguição nazista, escreveu um diário sob a forma de cartas dirigidas a uma amiga fictícia, por quem se sentia incondicionalmente aceita…”Não penso na angústia, mas penso na beleza de ainda viver”. Não é necessário voltar ao passado ou citar celebridades ou observar realidades tão distantes para verificar exemplos de resiliência. Basta olhar ao nosso redor para enxergar um resiliente. É possível ver, em favelas, algumas crianças que vivem em condições miseráveis, e mesmo assim conseguem se sobressair nos estudos. Há pessoas que nascem com deficiências físicas importantes, a ponto de ter a escolaridade prejudicada e que conseguem se destacar profissionalmente. Há aqueles que ficam por muito tempo desempregados e depois se sobressaem nos seus próprios negócios. Trata-se de algumas, entre várias situações de resiliência que podem ser assinaladas.
Os fatores de risco, expressos em termos de prejuízos, podem paradoxalmente criar no indivíduo uma espécie de escudo – suas resiliências. As pessoas resilientes transformam os fatores de risco em desafios, os quais passam a ser confrontados e podem ser superados. Atualmente a psicologia do desenvolvimento está muito interessada em identificar os fatores que contribuem para reforçar a capacidade de resiliência. Sabe-se que ela não é uma capacidade fixa, mas que pode variar com o tempo e com as circunstâncias. Podem ser descritas várias características das pessoas que possuem maior capacidade para resiliência: Inteligência, capacidade de reflexão, possibilidade de independência, capacidade de relacionamento, capacidade de iniciativa, humor, criatividade, noção interna de ética, dentre outras. Mas, para que uma criança cresça e se desenvolva como resiliente, ela precisa ter pais que sejam modelos de identidade valorizados e íntegros. Sentir-se incondicionalmente amada, por pais respeitáveis, garante para a criança a confiança em si mesmo, a capacidade para auto-apreciação, a capacidade para controle da impulsividade, a capacidade de empatia, o sentido de coerência, o significado e a finalidade quanto à própria vida. Cabe aos pais, cuidarem de sua da própria integridade física e psicológica, pois, assim, contribuirão para que o filho se sinta seguro e confiante no ambiente familiar e, por conseqüência, confiante na bondade das pessoas em geral e esperançoso na bondade do destino. Sentir-se incondicionalmente aceito por pais valorizados traz um incentivo de valor inestimável para o desenvolvimento da criança e dá forças para que ela enfrente dificuldades e supere adversidades. Nós todos almejamos um mundo “cor-de-rosa” para nossos filhos e ficamos penalizados quando precisamos ajudá-los a suportar dores, enfrentar frustrações e a curar feridas. O mundo “cor-de-rosa” não existe, as adversidades por certo virão. Precisamos criar crianças resilientes, que aprendam com seus erros, fracassos e decepções e que se tornem cada vez mais resistentes, mais fortes e mais crentes em vitórias. |