Quando nada se aquieta por baixo da armadura que exibe o sorriso – que sinceramente desejávamos que fosse verdadeiro. Quando perpetuamos nossas dores, sofrimentos e frustrações? Sempre teremos abismos à nossa volta, a pergunta é: o que faremos com eles?
Nossa trajetória é como uma estrada sinuosa, que ora torna-se retilínea. Às vezes, nos brinda com lindas flores coloridas pelo caminho. Às vezes com uma vegetação espinhosa. Outras tantas nos agracia com a vista do mar ou com a imensidão do abismo. A propósito, a estrada não seria nós mesmos?
Mesmo nos dias de céu límpido, não há estrada que nunca se depare com tempestades. E não tem quem, em sua existência, não tenha se deparado com abismos esmagadores. Aqueles em que o medo ou é o que nos move ou nos paralisa. Mas quando tempestades findam e os abismos permanecem em nós? Quando nada se aquieta por baixo da armadura que exibe o sorriso – que sinceramente desejávamos que fosse verdadeiro. Quando perpetuamos nossas dores, sofrimentos e frustrações? Sempre teremos abismos à nossa volta, a pergunta é: o que faremos com eles?
Todos os dias lutamos, contra esses sentimentos que habitam em nós. Esse aperto no peito que se expande até a garganta. Um nó que não se desfaz. Todas as manhãs ou antes de dormir inspiramos e expiramos, lentamente. Buscando a paz interior. Ao começar um novo dia nos prometemos, e suplicamos a qualquer força divina, que o hoje seja diferente. Demonstramos expressões faciais quem não são reais, para não compartilharmos nossas dores, angústias e sofrimentos.
Mas confesso que não queria sair da cama, tampouco ficar ali, a sós comigo. Nada me assusta mais que eu mesma. Porque dentre todos os flagelos, somos nós mesmos os piores carrascos. Já quis ir embora, mas desisti quando percebi que ninguém foge de si próprio. É uma questão pessoal e não territorial.
Nos torturamos, dizendo que somos dramáticos, que talvez não tenhamos nos esforçado o suficiente, que estamos jogando nossa vida em um buraco negro, que nada tem sentido. Em meio a tentativa de permanecer em pé, tudo parece nos desafiar. A música, os lugares, as pessoas e até a nossa própria mente nos sabota. Buscamos minimizar os sentimentos e acabamos deixando de sentir tudo. Nada nos empolga, nos motiva, é tudo parte da burocracia de estar ali.
Podamos aquele nó na garganta e não deixamos que se transmute em lágrimas – mesmo que em nosso âmago seja exatamente isso que acontece. Porque chorar seria o mesmo que admitir que algo não vai bem. E quase nos esquecemos que é justamente ao contrário. Isso não é sinônimo de fraqueza, é humano.
Sintamos nossa humanidade. Choremos de todo o nosso coração, do fundo de nossas almas, expurgando tudo o que nos paralisa, nos fere e causa dor. Choremos até soluçar, o rosto avermelhar e não termos mais lágrimas. Nos esvaziemos, para que outros sentimentos possam habitar em nós. Que o nosso pranto seja como a chuva de um dia de verão – intenso e passageiro. Respiremos fundo, respiremos fundo mais uma vez, e mais uma.
Então, sinta toda a sua dor e olhe diretamente para esse abismo diante de ti. Mas impeça que isso te paralise, encontre algo que te motive e faça disso sua força pra seguir em frente. Eu sei que é difícil passar por tudo isso, mas precisamos. Talvez demore, talvez não. Chore o quanto for preciso, compre quantos livros forem necessários, assista filmes, vá ao parque ou só observe o céu, compre chocolate ou faça qualquer outra coisa que te faça acalmar esse eu. Independente do tempo, não desista. Persista, mesmo achando que está no limite. Sempre haverá alguém ao seu lado, mas só você pode transpor os seus abismos.
Por ora sinta-se abraçado (a), porque talvez seja isso o que mais precisamos em alguns momentos: um abraço apertado e sincero, que nos dê um colo para chorarmos todas nossas pitangas e o pomar inteiro se for preciso. E lembre-se que cada abismo nos faz mais fortes, e se você chegou até ele é por que nunca desistiu de ir em frente. Lá mais adiante provavelmente nos depararemos com outros, e os olharemos mais confiantes, orgulhosos dos abismos que já superamos.