“Tenho duas armas para lutar contra o desespero, a tristeza e até a morte: o riso a cavalo e o galope do sonho. É com isso que enfrento essa dura e fascinante tarefa de viver.” – (Ariano Suassuna)
Ah, quem não passa maus bocados na vida que vá viver sua felicidade plena para lá, porque o ser humano tem no gene a missão de passar perrengue.

Dia desses ao sair do mercado, a chuva resolveu desabar e pegou a mim e muita gente no caminho para o carro. Mercado pequeno, estacionamento descoberto. Fomos todos molhados pelos baldes que São Pedro joga, não só em março nesta terra da garoa (e terra da tempestade também).

Uma senhora caminhava às pressas à minha frente e levava as sacolas plásticas nas mãos. Eu logo atrás dela empurrava o carrinho cheio, que era molhado pelos pingões de chuva. De repente, as sacolas dela arrebentam e as latas começam a rolar pelo chão molhado. Por uma fração de segundos fiquei estática, tal qual aquela senhora, vendo as compras caírem e aquelas latas se espalhando em meio aos pacotes que caíam também, mas não rolavam. A chuva caía e molhava toda aquela cena enquanto um ou dois carros passavam em direção da saída.

Encostei o carrinho em um canto coberto e, enquanto fui em direção a algumas das latas ela me fez um sinal e disse:

– Deixa! Deixa cair tudo. Depois pegamos! Está tudo embalado.

E soltou uma gargalhada daquelas deliciosas diante daquela catástrofe.

Eu disse a ela:

– Vamos recolher! Algum carro pode passar e atropelar alguma coisa!

Pensei comigo: por que ela está rindo?

E ela ainda rindo – inclusive da minha cara – me disse:

– E se formos pegar as latas, o carro pode nos atropelar! Seria bem mais grave!

E continuou:

– Deixa, são só umas compras. Quando as latas pararem nos pegamos tudo.

Havia se passado menos de um minuto porém, para mim, aquela correria de latas e pacotes de biscoitos espalhados estavam ali há uma eternidade e, para ser bem sincera, se minhas sacolas arrebentassem, eu sairia feito uma gandula estabanada correndo atrás de tudo.

Não havia ovos nas sacolas, nem nada que quebrasse com a queda, mas não era só aquilo que mantinha naquela senhora o autocontrole. O que a regia era o bom humor.

Ah, eu cobicei aquela capacidade de rir diante de tudo despencando, da chuva caindo, da correria que acomete todo morador de São Paulo quando o tempo fecha e a água cai. Ela riu de tudo aquilo porque teve a eficaz capacidade (que me faltou) de observar que não era tão grave assim. Em menos de um minuto havíamos recolhido tudo e ela seguiu depois de me agradecer com mais um daqueles sorrisos encantadores.

Chamei aquele momento de Terapia do Riso.
E aprendi naquele dia que é muito útil conseguir rir de situações corriqueiras que realmente não são tão graves e nem tão trágicas quando parecem. Quantas vezes não nos desesperamos diante de coisas tão banais?

Não é sempre que dá para rir dos imprevistos, porém algumas tempestades podem ser evitadas, como as que fazemos em copos de água, por exemplo.

Às vezes o pote de vidro cheio de molho de tomate se espatifa na cozinha cujo chão lavamos naquele dia. Quer saber? E daí? Que tal sentar-se no chão, rir daquela “pseudo desgraça” para depois limpar tudo? Em menos de quinze minutos aquela tragédia grega desaparecerá sem estragar o nosso dia.








Psicóloga, psicoterapeuta, especialista em comportamento humano. Escritora. Apaixonada por gente. Amante da música e da literatura...