Mulheres relatam noites em claro, dores para amamentar, cansaço, tristeza e culpa após chegada do bebê…
Por mais que tivesse se preparado para a chegada de Eloáh, Mylena não imaginava que seria tão difícil. Casa cheia e presentes para dar as boas vindas ao novo membro da família. Avó, pai, prima, tio, irmãos… Todos querem segurar aquele “serzinho” tão pequeno. Logo, todos vão embora. O pai volta a trabalhar. A mãe fica só, com o bebê tão esperado. Mas ao invés de alegria, uma tristeza a consome por dentro e, com esse sentimento, a culpa. Essa fase, ainda desconhecida por muitas mulheres, tem nome: Puerpério. E, falar sobre isso, ainda é tabu.
“Após três dias na maternidade, recebemos alta e achei que, enfim, tudo estaria bem. Não sabia o que me esperava. Eloáh acordava de meia em meia hora, gritando de fome. Eu estava emocionalmente abalada, com problemas pessoais e o leite não descia. Eu precisava descansar. Estava destruída por dentro e por fora, precisava que alguém cuidasse de mim. Mas todos só tinham atenção para ela”, lembra Mylena Nascimento, 25.
De acordo com a empresária, por mais que tivesse se preparado para a chegada da primogênita durante pouco mais de nove meses, não imaginava que a rotina seria tão complicada. Recusou ajuda na primeira semana. Porém, após quase entrar em depressão, entendeu a necessidade de ter uma rede de apoio. Enfrentou seios machucados e dor para amamentar, noites em claro e medo de falhar.
“Eu não sabia o que fazer. Nessa hora, lembrei de uma conversa que tive com a minha mãe, na reta final da gestação. Ela disse ‘minha filha, eu venho ficar com você nos primeiros meses’. Mas respondi que iria me virar sozinha. ‘Não vou poder fazer nada (fui submetida à cesárea de emergência e precisava tomar cuidado) e, se não puder cuidar da minha filha, vou enlouquecer’. Ainda bem que minha mãe ficou, senão, ia cometer uma loucura”, confessa.
Pouco mais de três meses após o nascimento da filha, Mylena continua a aprender sobre a “maternidade real”, nada romântica como mostra a mídia. A diferença, ressalta, é que conseguiu estabelecer uma rotina com Eloáh, voltou a cuidar de si e a trabalhar por sonhos antigos que estavam adormecidos. Um dos planos, inclusive, é ajudar outras mães a lidar com os desafios do pós-parto.
“Na hora da dor, entendi que eu não podia mais pensar em mim. O sentido da maternidade estava ali, na pele. Mas eu precisava ser cuidada. Só minha mãe via o quanto eu sofria. A Isabela [Persilva], enfermeira que me acompanhou na gravidez, incentivou a me arrumar, dizendo que eu era linda e que tudo ia ficar bem. Algo simples, mas que me ajudou muito. Cuidamos do bebê. Mas quem cuida da mãe”, enfatiza.
Um ‘grito de socorro’
O sonho de ter filhos sempre esteve presente na vida de Renatha Thainan Ribeiro Bastos, 21. Entretanto, a realização dele foi diferente do esperado. A notícia da gravidez não planejada do ex-namorado foi um choque. O pai de Eliseu ficou feliz, assim como os avós. Porém, a decisão de a mãe criar o bebê sozinha gerou críticas. No puerpério, os desafios foram ainda maiores.
“Meu mundo caiu. Decidimos não ficar juntos. Além da pressão das pessoas, perguntando o porquê de não decidirmos casar, sofri muito sem apoio de quem eu mais precisava. Foi uma gravidez bem conturbada, mas a cada batida do coração que ouvia nas ultrassons e os chutinhos que sentia, eu tinha certeza que todo sofrimento iria valer à pena”, afirma.
Há 5 meses, o menino nasceu de parto normal. Em dois dias, mãe e filho voltaram à casa dos pais da moça, onde começaram o processo de adaptação. Com dificuldades para amamentar, privação de sono e muitos “pitacos” de familiares e conhecidos, a estudante se sentia perdida. Chorou, se sentiu culpada e pensou em desistir. Até que buscou ajuda com psicólogo.
“Quando conseguia que ele dormisse, chorava sozinha. Me achava uma péssima mãe. Após receber ajuda com psicoterapia, entendi que, mesmo as coisas não sendo como eu sonhei, precisava da ajuda das pessoas. Continuo tendo um desafio novo a cada dia, mas aprendi que se eu tiver meu pequeno do lado, sorrindo, eu posso vencer ”, completa.
Depressão pós-parto
Mesmo com apoio constante da família e de amigos próximos, Fernanda Cristina Neidert Batista, 27, ainda enfrenta uma batalha diária com a maternidade. Aos três meses, Augusto ainda tem crises de choro constantes por conta de cólicas – segundo a avaliação da pediatra, que prescreveu medicamentos. Mas, para desespero da mãe de primeira viagem, eles não tiveram o efeito esperado.
“Foi difícil, principalmente, por eu ser psicóloga e saber (na teoria) que eu deveria manter calma e tranquilidade para o desenvolvimento do meu bebê. Mas na prática é muito difícil. Não era o cansaço físico que tomava conta de mim, mas o mental. Uma mistura de culpa pelo o quê meu bebê estava passando, mais o desespero por eu estar cuidando ao extremo e, mesmo assim, ele não melhorar”, afirma.
Diagnosticada com depressão pós-parto, ela lida com “cansaço extremo” e não tem vontade de sair de casa ou se arrumar. No primeiro Dia das Mães dela, em maio, o bebê teve uma crise de choro intenso. A data foi comemorada depois, quando Augusto estava mais calmo, com um ensaio fotográfico em família, após muito incentivo do marido.
“Quando olho cada fotografia, consigo observar que a fotógrafa conseguiu captar a essência do nosso sentimento de realização enquanto família. Mesmo diante da dificuldade do puerpério, amei e estou amando a experiência de ser mãe do Augusto. Não podemos dizer que o puerpério ou a maternidade é fácil. Mas mesmo sendo um período de extrema turbulência, é lindo; todas as dificuldades, em algum momento, irão passar”, finaliza.
BLOG Adriana de Melo Lima, 39, psicanalista
“O puerpério corresponde a um estado de alteração emocional, provisória, no qual existe uma maior fragilidade psíquica, tal como no bebê. E que, em certo grau de identificação, permite as mães se ligarem intensamente ao recém-nascido, adaptando-se ao contato com ele e atendendo as suas necessidades básicas. Nesse período, outra característica comum com a chegada do bebê é o surgimento da ansiedade e dos sintomas depressivos. A mulher continua a precisar de amparo e proteção, assim como ao longo de toda a gravidez; e, muitas vezes, essa necessidade é confundida com depressão patológica, sendo que a mulher pode atravessar um período conhecido como Baby blues (tristeza materna primária) o qual está associado às adequações e perdas vivenciadas pela puérpera após o nascimento do bebê. Afinal, o humor depressivo faz parte desse período e é favorável para que a mulher elabore os lutos decorrentes dessa fase. Diante disso, é de suma importância os cuidados que a mulher deve ter pré e pós-parto, buscando grupo de apoio, análise pessoal, para poder falar sobre suas experiências, se identificar com outras falas e aprender a lidar com a ambivalência do amor materno entre outras. Necessário se faz que a mulher seja acolhida e cuidada nesse processo do tornar-se mãe.”
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