Até onde você conhece quem você ama? Provavelmente muito pouco. E por mais que te pareça muito, ainda é pouco diante do tanto de coisas que um ser humano pode ser ao mesmo tempo – tantas coisas que nem ele mesmo sabe.
A gente muda e amadurece de uma maneira tão vertiginosa que nem a gente mesmo acompanha. E aí vem o outro querer saber de nós. Tudo de nós.
As relações mais destrutivas que conheço são baseadas em um conhecimento mútuo exagerado e invasivo. Daquelas relações em que você conhece tanto ao outro que acaba machucando. E acaba tentando transformar o mundo do outro no seu próprio mundo. É que chega uma hora que você conhece tanto que vive as dores do outro, as perdas do outro, os processos mentais do outro. Além de sofrer por si e pelo outro, você acaba por tentar transformar a outra pessoa naquilo que você acredita – sem entender que, não, ninguém é responsável pelas suas projeções.
Sou a maior adepta da intimidade. Do “vem cá, você ta bem?”. Das conversas francas, da sinceridade absoluta – mas não do conhecer o outro de uma maneira que agrida a relação e a cada um individualmente. Você pode até achar o máximo poder prever as razões de cada suspiro alheio, de cada mínimo sinal pessoal, e tudo bem. A gente não precisa concordar sempre, combinado?
Mas eu acredito em um conhecimento que respeite um espaço que simplesmente não pode ser ocupado. Como se houvesse uma placa de “não ultrapasse” na alma de cada um. Porque é claro que todo mundo tem suas ilhas de solidão. Todo mundo tem em si um cantinho escuro que luz nenhuma pode – e nem deve – iluminar.
Não force a porta do mundo do outro, porque vai doer muito mais em você do que nele. Não queira saber no que o outro está pensando o tempo inteiro. O que sente, o que deseja, o que espera. Conheça o que lhe for mostrado e respeite isso como mero espectador que é porque isso é muito mais que uma prova de amor. É uma prova de humanidade. E das poucas certezas que tenho na vida, talvez seja essa a maior: o jeito mais humano de preservar relações – e pessoas – é respeitar a placa de “não ultrapasse”.