Psicologia

A BUSCA PELO SUCESSO ESTÁ NOS MATANDO

Estamos cada vez mais competitivos, tomando menos cerveja com os amigos e mais Prozac.

Meu celular caiu. E quebrou.

Esse fato não é surpreendente, até por que sabemos claramente que os produtos a muito não são mais feitos para durar. Mas este acontecimento me levou a uma reflexão.

Vendo o celular quebrado me senti incompetente. Não pelo aparelho, não pelo que ele representava para mim, mas pela minha incompetência em cuidar de um aparelho por pouco mais de um ano. De imediato comecei a pensar em tudo que já tentei fazer e não consegui: estágios, vagas, intercâmbios, feiras.

Não consegui guardar o cartão de crédito por mais de dois meses e só este ano estou no terceiro.

Não consegui guardar meu próprio documento de identidade e tive que pedir outra via.

Não consigo saber sequer onde está minha chave neste momento.

Como diz minha avó, mente vazia oficina do diabo. Logo me peguei analisando todos os meus fracassos e quanto eles significavam pra mim, o quanto eles me massacram e pesam na minha consciência. Não conseguia ver nada de positivo nestas experiências que passei, e não conseguia ver nada em que me considerasse competente.

Então me lembrei do recente caso do marido que se suicidou após matar esposa e filhos por não se sentir capaz de sustentá-los, que preferiu a morte ao “fracasso”. Por não se sentir competente, ele preferiu findar a própria vida e dos seus entes. Senti uma empatia enorme para com este homem, pude compreender o quão pesado deveria estar seu fardo, a cobrança sobre ele, para que fosse bem sucedido, para que desse uma vida de alto padrão para sua família, para que se encaixasse em regras pré-estabelecidas, para que ele tivesse sucesso.

A que ponto chegamos! As pessoas estão se matando aos poucos para chegarem ao tão sonhado “sucesso”, para terem seu lugar ao sol. Chegam mais cedo no trabalho, saem mais tarde, não veem os filhos, tomam menos cerveja com os amigos e cada vez mais Prozac. Estamos cada vez menos sensíveis e mais irritados. Paciência parece estar em extinção.

Somos bombardeados a todo o momento por exemplos de “sucesso” que a mídia faz questão de veicular, mas que a mesma esquece-se de dizer que são exceções. Não somos todos Bel Pesce que abre uma startups com a mesma facilidade que a maioria de nós abre uma Coca Cola. Não somos todos Kéferas fazendo sucesso na internet e faturando com vídeos no YouTube.

Não digo que o sucesso desses jovens tenha surgido do nada, e entendo que eles fizeram por merecer onde estão, se esforçando mais que os demais para chegarem aonde chegaram, porém eles são EXCEÇÕES! Eles não são a regra!

A regra ainda é aquele jovem que acorda cedo e pega a condução para o trabalho – isso quando não pega mais de uma -, que vai direto do trabalho pra faculdade, que faz as tarefas depois da aula e antes de sair pro trabalho, que gasta grande parte do salário pra pagar o curso, que ouve dos professores dizendo “O que você faz de meia noite as seis?” e fica que fica indignado. E esse mesmo jovem ainda não pode se sentir frustrado quando o entrevistador o pergunta como é possível que com 21 anos de idade ele, não esteja fluente em Inglês e Espanhol e não possua experiência prévia, afinal de contas, estes são os quesitos básicos para conseguir um emprego!

Tentar dar um passo de cada vez parece ser coisa do passado. O negócio agora é outro.

Como um ciclo vicioso, a sociedade exige mais das pessoas e as pessoas fazem o possível para alcançar o padrão, e então o ciclo recomeça. Por isso temos a impressão de que quanto mais corremos, mais longe da chegada estamos. Por isso às 24 horas do dia já parecem não ser mais suficientes para o trabalho, a faculdade, o curso de línguas, informática, networking.

Enquanto o tempo parecia correr mais devagar para nossos pais, para nós parece estar sempre acelerado. Espera se de um jovem de 20 anos da geração Y, o que se esperava de um homem de 40 da geração X. As pressões sociais são mais fortes para esta geração que já é cobrada quanto à faculdade desde o início do ensino médio, que é questionada da pós graduação nos primeiros semestres do curso. Estamos no agora, com a mente no futuro e – muitas da vezes – com a alma no passado.

Somos cobrados a acertar tudo na primeira vez e esquecemos que Thomas Edison tentou mais de mil vezes até conseguir fazer a lâmpada. Somos rotulados como “jovens sem direção”, mas esquecemos que J.K Rowling trabalhou como secretária, só vindo a lançar os livros da saga Harry Potter após os 31 anos. Sem contar com os inúmeros casos que são apenas números e estatística, que não tem nome nem rosto, mas que refletem a realidade.

A ambição pelo sucesso parece já vir em nosso DNA. Estamos cada vez mais competitivos, agindo em tudo como se até mesmo a escolha do café da manhã fosse uma questão de estratégia. Perdemos a noção do que é importante e aceitamos um padrão de sucesso – que nem sempre nos cabe – sem ao menos questionar o que é sucesso para nós, se o que é pré-estabelecido realmente nos cabe.

Algumas pessoas decidiram criar a própria definição de sucesso e abandonar os padrões sociais. Alguns os chamam de hippies, outros de visionários, outros de revoltados. Eu prefiro chamá-los de viventes.

 

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