Não acho que seja algo que podemos generalizar, mas infelizmente, nos últimos tempos, tenho me deparado com um ressentimento silencioso permeando as relações após o período de eleições.
Eu desejo que meus amigos me aceitem e permaneçam a meu lado sem exigir que eu somente satisfaça aos egos deles. Eu quero que meus amigos confiem em mim e me permitam confiar neles, para que tenhamos a liberdade de ser quem somos sem receio de sermos deletados ou pré-julgados frente à menor divergência. Eu quero a liberdade de sumir ou silenciar por um tempo, sem que isso cause constrangimento ou ressentimento. Eu desejo a paz de ser quem eu sou, sem que isso gere preocupação ou especulação.
Eu era um tipo de pessoa que sempre se preocupava em agradar aos outros. Um tipo de pessoa que sempre cedia à pressão social e quase anulava a si mesma em prol das opiniões e expectativas dos que me rodeavam. Seria normal que, nesse período de ebulição que foram as eleições, pressionada socialmente pela maioria dos que se relacionam comigo, eu cedesse e seguisse a opinião do meu grupo, da minha bolha social. Porém, não foi o que ocorreu e tenho arcado com as consequências.
Como eu disse, agradar aos outros era tão entranhado em mim que eu não sabia que poderia ser de outro jeito. Eu imaginava, erroneamente, as piores catástrofes se ousasse assumir uma versão mais autêntica de mim mesma, nem sempre de acordo com o que esperavam de mim, porém mais coerente com meu coração. E durante muito tempo acostumei a ser assim e acostumei as pessoas a esperarem isso de mim.
Entretanto, quando as pessoas se habituam a uma versão sua, elas estranham qualquer mudança. E, mais do que isso, elas se ressentem da mudança, como se isso fosse algo direcionado a elas, e não um propósito em sua própria vida.
Há uma frase, cujo autor desconheço, que diz assim: “As pessoas querem que você esteja bem, mas nunca melhor do que elas”. Não acho que seja algo que podemos generalizar, mas infelizmente, nos últimos tempos, tenho me deparado com um ressentimento silencioso permeando as relações após o período de eleições. A sociedade se dividiu em dois grandes grupos, que divergem em questões não meramente políticas, mas também ideológicas e morais. E no meio de tudo isso, não faltam aqueles que esperam que o grupo divergente receba “uma bela lição”.
Porém, no grupo divergente há a sua mãe, a sua tia, o seu amigo de infância, o seu crush! O que fazer com isso? Acusá-los de “comunistas” ou “fascistas” e esquecer que um dia compartilharam tantas coisas boas juntos? Desejar que fiquem bem, mas nunca melhor que você? Ou, pouco a pouco, aprender a aceitar que as pessoas são livres e têm direito de pensar e agir diferente de você, e por mais que você discorde delas, isso não apaga tudo de bom que essas pessoas têm e que você conhece bem?
De repente houve um apagão de memórias coletivas e só aprovamos aqueles amigos que votaram no nosso candidato. Todos os outros foram relegados a um esquecimento (quando não a um ressentimento, beirando o ódio) e, de uma hora para outra, parece que deixaram de ter qualidades ou afinidades que faziam deles nossos chapas.
Nem sempre a opção por um candidato refletiu a visão de mundo de alguém. Muitas vezes foi fruto da falta de informação, medo, falta de opção. Porém, muitas vezes nos sentimos aptos a deletar um amigo ou parente de nossas vidas simplesmente porque ousou discordar de nós.
Há os que defendem a ideia de que, se os valores morais foram realmente colocados em xeque e as opiniões divergiram, não se deve voltar à amizade. Infelizmente, muitas narrativas conflitantes vieram à tona nesses tempos sombrios e não há como negar que isso realmente abalou as relações. Porém, os confrontos também nos ajudam a crescer, a amadurecer, a ampliar nossas visões, e precisam ser levados em consideração, justamente porque nos ensinam a aceitar e lidar com as diferenças, e a romper nossas bolhas sociais.
Eu desejo que meus amigos me aceitem e permaneçam a meu lado sem exigir que eu somente satisfaça aos egos deles. Eu desejo amar meus amigos num ambiente em que eu me sinta à vontade para ser eu mesma, falando e agindo de acordo com meu coração, e não somente sendo uma sombra ou reflexo da personalidade deles. Igualmente, eu espero de meus amigos a transparência e a fidelidade aos próprios ideais deles, sem exigir que sejam o que não são, só para me satisfazer. Eu quero que meus amigos confiem em mim e me permitam confiar neles, para que tenhamos a liberdade de ser quem somos sem receio de sermos deletados ou pré-julgados frente à menor divergência. Eu quero a liberdade de sumir ou silenciar por um tempo, sem que isso cause constrangimento ou ressentimento. Eu desejo a paz de ser quem eu sou, sem que isso gere preocupação ou especulação. E, acima de tudo, desejo que meus amigos não desistam da nossa amizade frente ao menor desentendimento, pois não se ignora tantas afinidades por uma adversidade…
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