“Sair” sempre foi difícil para mim. Não me entenda mal, adoro viajar e já fui para vários lugares do mundo, de Ushuaia a Pequim a Budapeste, de Reykjavik a Oslo, e de vez em quando gosto de uma festa animada. Mas, na maioria das vezes, prefiro estar sozinha ou com minha pequena família, na natureza ou em casa, escrevendo, lendo ou avaliando as submissões para minha pequena editora, um trabalho que faço com muita paixão.
Quando era criança, passava horas sozinha no quarto, feliz por ler e escrever. Minha mãe sempre perguntava: “Por que você não sai para brincar?” Mas eu não queria sair para brincar. O que muita gente bem intencionada não entende é que os introvertidos preferem estar sozinhos. Mas isso não significa que não demos valor a amizades e relacionamentos; só que nos sentimos melhor em círculos sociais menores e que gostamos de nossas interações sociais em pequenas doses.
Em Quiet: The Power of Introverts in a World That Can’t Stop Talking (Silêncio: a força dos introvertidos em um mundo que não consegue parar de falar, em tradução livre), Susan Cain mergulha na ciência da introversão. Introvertidos são simplesmente diferentes, em nível neural. Muitas interações no nível da superfície (conversas no playground e eventos) nos deixam exaustos. Precisamos passar tempo sozinhos e precisamos de silêncio – não porque sejamos anti-sociais, mas porque achamos que longos períodos de interação social são extremamente cansativos. Gostamos de gente, mas, depois de um tempo, precisamos recarregar as baterias.
Queria que quando eu era criança tivessem me falado que é OK querer estar sozinha.
Introversão também não tem a ver com timidez. Não é necessariamente medo social ou constrangimento. Sinto-me plenamente à vontade num palco, entretendo a plateia, e considero esta uma parte importante do meu trabalho de autora e contadora de histórias. Em festas em que não conheço ninguém, posso não te abordar, dizendo: “Oi, meu nome é Michelle”. Mas vou me aproximar, sorrir, ouvir e fazer perguntas sobre o que considero interessante em você. Muita gente gosta de falar de si mesma, e os introvertidos, de ouvir. Quem não quer ser ouvido?
Queria que quando eu era criança tivessem me falado que é OK querer estar sozinha. Queria que os estudos sobre a felicidade e sua relação com a extroversão e a introversão levassem em conta o grande contentamento que nós introvertidos sentimos quando estamos envolvidos em tarefas intelectuais recompensadoras. Escrever me faz feliz. Meus livros me transportam para outros lugares e criam conexões reais com desconhecidos. Como os leitores tendem a sentir uma certa intimidade com um livro que os agradou – e, por extensão, com o autor –, muitas vezes vamos direto ao que interessa. Leitores entram em contato comigo por email ou me abordam em eventos para falar de suas perdas, contar suas histórias e detalhes importantes de suas vidas. Essa conexão é significativa e me traz muita alegria. Estou plenamente envolvida nesses momentos, porque tenho tempo suficiente para escrever meus livros sozinha.
Como vários introvertidos, o equilíbrio é fundamental. Podemos gostar de você, mas uma “noite das meninas” não será nossa primeira escolha. É mais provável que a gente prefira tomar um café com você ou com um grupo bem pequeno de amigas, para ouvir o que você tem a dizer e entender de verdade o que está acontecendo na sua vida. Se vejo um grupo de mãe reunidas na saída da escola, tendo a ficar à distância. Não porque seja tímida ou porque não goste delas – mas porque as conversinhas esgotam minha energia. Mas, se vejo uma das mulheres sozinha, é outra história. Em pequenos grupos não há paredes. Conseguimos passar do bate-papo e descobrir coisas reais sobre os outros – que a exuberante mãe de quatro sonha em abrir seu próprio negócio, que a mulher que você só vê de legging era enfermeira de UTI até pouco tempo atrás.
Introvertidos precisam de tempo para refletir, para se conectar com seus pensamentos e sonhos.
As pessoas são muito mais interessantes quando você sabe de onde elas vêm, o que anseiam, por que fazem as coisas como fazem. É difícil descobrir esse tipo de informação quando tudo está acelerado e em alto volume. Os momentos de silêncio permitem conexão, e conexão é importante para os extrovertidos.
Mas, além de se conectar com os outros em nível íntimo, os introvertidos precisam de tempo para refletir, para se conectar com seus pensamentos e sonhos. Sim, somos sonhadores. Quando era criança, tinha amigos. Me dava bem com meus professores. Contava piadas (e até me elegeram a menina mais engraçada de uma turma grande do colégio, apesar de achar que o responsável pelo anuário daquele ano talvez tenha me dado uma forcinha). Mas um dia inteiro de interações na escola nunca foi fácil, então usava a sala de aula para fugir para dentro da minha cabeça. Adorava inglês e usava a chatice e a ansiedade da matemática e da biologia para escrever em segredo. Escrever e sonhar acordada representavam uma saída – era um espaço silencioso num mundo caótico. Era minha fuga. Hoje sei que fazia isso porque um dia todo na escola é exaustivo para os introvertidos.
Vejo essa exaustão todos os dias no meu filho, depois da escola. Sei como ele se sente e tento não enchê-lo de compromissos. Ele tem vários amigos, e eles são muito importantes. Mas entendo que, depois de um dia inteiro na escola, ele vai ficar feliz passando um tempo sozinho em casa, ou então na companhia de um ou dois amigos. Depois de um jogo ou de uma festa ele sempre precisa de um tempo e um espaço para se recuperar.
Se você é extrovertido e seu filho ou sua filha é introvertido, não se alarme se seu filho precisar ficar sozinho de vez em quando. É uma resposta natural à sobrecarga sensorial e social. Lembre-se: não se trata de uma falha de personalidade ou de um sinal de tristeza. É simplesmente como ele ou ela responde ao mundo em nível neural.
Se você é introvertido, não deixe que os outros te façam se sentir mal porque você não quer “sair mais”. E se você é extrovertido e está sempre tentando arrastar o introvertido para fora de casa: sabia que ele talvez esteja feliz assim. Não presuma que os introvertidos da sua vida não gostem do você ou não te achem interessante. Não é por timidez que eles não vão à sua festa, nem por que são esnobes. Introvertidos são como você, mas mais quietos. Precisamos de um tempo sozinhos e, às vezes, precisamos de um tempo sozinhos com você – só nós dois, realmente conectados.
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