Eu ando tentando escrever uma carta de amor. Uma missiva de destinatário indefinido e endereço não encontrado. Um bilhete honesto e gentil, escrito à mão, como se fazia antigamente.
Traço cada linha dela com apreço, aplicado em mostrar a quem a ler a firmeza de minha mão estendida e o apreço de meu coração amigo. Assim que eu a concluir, vou enviá-la a Deus e ao mundo.
Tenho fé que minha cartinha passará de mão em mão e de alma em alma. E que suas palavras tocarão, silenciosas e precisas, o lugar mais fundo no coração de toda gente.
Com sorte, ninguém sairá impune ao meu recado breve e simples. Ainda que seja pelo menor instante que vive dentro de um segundo, quem pousar os olhos sobre minha cartinha vai se pegar sentindo amor, saudade, ternura e essas coisas que nos destacam das amebas e dos protozoários.
Inimigos ferrenhos baixarão a guarda e desistirão do ataque. Fofoqueiros maldosos sentirão a pele queimar de vergonha por suas intrigas. Punhos armados tombarão em completa entrega, incapazes de todo embate.
E cada um de nós não terá outro jeito de seguir no mundo senão sustentado em gentileza e trabalho, amizade e respeito, esperança e amor.
Depois de percorrer tantas mãos, puída e cansada de penetrar tantas almas, minha carta será resgatada de um banco de praça por um vento franco e conduzida de volta aos céus, onde o anjo que me havia soprado suas palavras a receberá sorrindo, satisfeito por seu bom trabalho.
E em algum lugar aqui embaixo, no escuro silencioso da casa que dorme, uma moça linda vai pensar em mim com ternura.
Por um instante infinito, ela vai enfrentar a infantaria e levar o povo livre à vitória, enquanto sonha com o nosso encontro breve e esperado, que seu mundo seguro tornou proibido e distante embora vivamos tão perto. Tão perto.