Hoje vou levantar mais cedo para ver o céu alaranjado da manhã. Vou subir no telhado feito gato, e enquanto o dia nasce, vou tocar o céu com os dedos e soprar sobre mim uma brisa de felicidade.
Vou colocar aquela roupa bonita que deixei guardada para ocasiões especiais e vou usá-la sem preconceitos bobos. Vou sair voando e de propósito esquecer o café da manhã só pra me empanturrar com bons dias recheados de atenção.
Vou desligar o celular e ouvir apenas o toque dos meus pensamentos. Farei juras de amor para meu coração e prometerei ouvi-lo atento todas as noites antes do sono chegar.
Abrirei um mapa de possibilidades e vou circular tudo que gostaria de conhecer e fazer, mas que deixei irremediavelmente para depois. Aquele depois que parece um saco sem fundo no qual atiramos nossas vontades mais delirantes.
Vou comprar sapatos como os da Dorothy de Oz e vou batê-los buscando voltar para mim. Abandonarei as obrigações urgentes e me darei a alegria de fazer o que bem entender.
Hoje vou escolher só a felicidade, ela combina bem com tudo e torna meu sorriso absurdamente charmoso. Vou guardar as olheiras do desânimo e vou soltar em algum mato os grilos da minha cabeça.
Vou pentear meus cabelos de um jeito diferente. Esticá-los e depois enrolá-los de um jeito que nunca fiz antes.
Vou me sentar em um banco dentro de um parque lindo e esperar, sem ansiedades ou dúvidas bobas, eu mesma chegar.
Vou abraçar-me demorado e me perguntar dos gostos meus, se eles ainda são aqueles de antes das imposições do que precisa ser feito.
Vou me convidar para soltar bolinhas de sabão ao vento e não vou ligar se meu vestido levantar quando pular alto para alcançar as nuvens.
Vou subverter o tempo e saltar sobre ele, voltando para dias de escolhas que mudaram minha vida. Vou me olhar carinhosa e me puxar para um canto e, em cochichos, contarei a mim todas as verdades que descobri.
Vou usar o lenço das lágrimas que chorei pelos amores errados para limpar os vidros das janelas do meu eu, e com a visão clara de minhas aspirações, não aceitarei migalhas para matar a fome gigante que me habita.
Vou colocar as minhas músicas preferidas no último volume e vou dançar feito louca, varrendo para longe minhas expectativas tolas acerca dos outros.
Vou enlaçar o lobo do amor próprio que vive nas pradarias do me eu e serei dele a dona cativa, estufando o peito ao gritar “não” para tudo que for contrário aos meus valores.
Vou fazer uma poção encantada para enfeitiçar o medo e o farei dormir por tempo indeterminado em uma torre bem distante das minhas conquistas.
Vou fazer dieta de sofrimento, de autopiedade, de culpa, de contentamento e vou salgar minha comida com um monte de coragem ousada.
Vou jantar a luz de velas, mesmo quando existirem luzes ao alcance da mão e vou caprichar na sobremesa para dividi-la com o meu eu mais animado.
Vou me apaixonar por mim, por todas minhas mazelas e por todas minhas tentativas. Rirei dos meus erros bobos, mas guardarei todos nos bolsos para não repeti-los amanhã.
Vou tomar banho de espuma. Vou beber champanhe barato de ano novo, brindando a minha vida e todos os acasos e não acasos que me levaram até onde estou.
Vou abraçar meu coração e adormecer. E de manhã, quando o sol gritar “recomeço” vou sair pela porta de mãos dadas com tudo que sou, carregando comigo a certeza de que minhas escolhas serão acertadas por levarem em conta especialmente o que é também bom para mim.
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