Por outro lado, se estamos falando de dinheiro e carreira, teimo em deixar o meu lado racional falar mais alto.
Isso deve ser normal, pois quando estamos falando de dinheiro consequentemente estamos falando de estabilidade, e eu sou bem apegada à estabilidade. Desde o meu primeiro estágio, guardo dinheiro, como se amanhã fosse estourar uma guerra. Sou até meio controladora demais, de vez em quando, mas isso me proporcionou muita maturidade.
Todo bom publicitário sabe que essa carreira não paga bem no início, então, se eu não tivesse disciplina para economizar, provavelmente, não teria guardado muito dinheiro ao longo dos meus primeiros anos no mercado de trabalho.
Bom, tudo isso para dizer que, desde o meu primeiro emprego até alguns meses atrás, sempre me deixei levar pelo racional, quando o assunto era trabalho.
Por mais que tivesse consciência de que o meu coração gritava pelo contrário, eu abafava esse som. Queria, mas não podia ouvir. Uma sensação de culpa e angústia tomava conta da minha mente. Eu não sabia o que fazer.
Por muito tempo foi assim, sem saber o que fazer. O medo de perder o chão, viver uma vida sem estabilidade garantida, sempre foi assustador. O que fazer se o dinheiro não entrar na conta? Como sair para jantar? Não vou mais viajar? E a gasolina, como vou pagar?
Perder a estabilidade é como perder o chão, você não sabe onde vai cair e tem medo de nunca mais sair de lá. Por muito tempo, esse era o medo que eu tinha. O caminho mais comum, seguido por todos, não era o que me fazia feliz, mas mesmo assim não conseguia ter clareza de outras possibilidades. A minha prioridade era garantir a estabilidade.
Após muito tempo me questionando sobre o rumo que estava dando para a minha vida, finalmente me dei conta de que o problema era maior do que eu imaginava. Não era a ganância das agências de publicidade nem o caos do terceiro setor, havia algo maior que não fazia sentido durante os cinco dias da semana em que ficava enclausurada no escritório.
E pensar que foram necessários mais de quatro anos para chegar a uma conclusão simples: o mundo corporativo não é para mim.
Ter meus horários definidos por uma empresa? Ficar três horas por dia presa no trânsito, com dores na cervical? Passar o dia inteiro sem ver a luz do Sol em um escritório cheio de gente? Ser obrigada a aguentar infinitas reuniões e sorrir para não demonstrar que estou cansada? Precisar pedir permissão para sair trinta minutos mais cedo para ir ao médico?
Isso nunca foi para mim. É claro que o incômodo foi se acentuando ao longo dos anos, conforme fui amadurecendo e me formando como profissional, mas eu sempre soube que havia algo errado.
Por muito tempo, eu me senti presa nos escritórios, eu via o dia passando pela janela do escritório e ficava incomodada porque eu não tinha a liberdade de fazer os meus horários e, sei lá, ir ao cinema na quinta-feira à tarde, se quisesse.
A princípio, essa pode parecer uma história muito romantizada, na qual um dia acordo e tomo a decisão de sair do regime CLT, mas não foi fácil aceitar. Sair do corporativo tradicional implica inúmeras consequências, desde não ter mais plano de saúde e vale-refeição, até a necessidade de ser muito disciplinada para trabalhar em casa.
Mais do que isso, a parte mais difícil é criar coragem. Quando ganhamos uma quantia exata por mês, que nos garante viver suficientemente bem, é difícil se abrir para o desconhecido de uma transição.
A coragem não chegava nunca. Mesmo quando eu já tinha dinheiro o suficiente e clientes estáveis, continuava complicado virar a chave. O meu coração praticamente berrava: “Vá em frente, chegou a hora!” Já a minha cabeça argumentava: “Espere mais um pouco, garanta mais estabilidade, caso algo dê errado!”.
E o receio de que algo desse errado me perseguia, até entender que sempre poderá dar errado e esperar mais não mudaria isso. Já tinha o dinheiro, os clientes e a vontade, só faltava assumir a minha escolha.
Por mais que eu pedisse conselhos para meus amigos e familiares, nunca ouvia o que precisava. As pessoas normalmente ficavam receosas com esse novo passo em minha carreira e costumavam dar conselhos que visavam à priorização da minha estabilidade, “espere mais um pouco!”, falavam. E eu ficava me questionando se era ou não a hora certa.
Tudo mudou um dia em que, exausta por não conseguir mais lidar com a minha rotina e obrigações em um ambiente que não tinha mais absolutamente nada a ver comigo, tomei a decisão. A minha mente não ia mais para o escritório, eu era como um esqueleto ambulante que ia para lá, sorria e torcia para os ponteiros do relógio correrem cada vez mais rápido, assim eu poderia ir para casa viver a vida que estava planejando para mim.
Quando finalmente aceitei a decisão, ainda não estava 100% confortável, tinha alguns receios e dúvidas, mas me joguei, sabia que o meu planejamento financeiro era suficiente e que já tinha uma renda estável para os próximos meses.
Não podia mais postergar, aquilo estava me consumindo. O meu espírito não é como o de amigos meus, que adoram ter uma rotina regrada e ficam tranquilamente o dia todo em reuniões entediantes no escritório climatizado. Detesto isso, preciso ter a flexibilidade de fazer os meus horários e decidir como e quando vou trabalhar.
Para completar, não gosto de ficar presa a uma instituição, bater metas e respirar os valores da empresa. Nunca, em nenhum dos meus empregos celetistas, fui uma funcionária empolgada, “corporativamente falando”. Justamente por isso, não faz sentido me prender a nenhum lugar.
Dizer adeus ao meu emprego (CLT) foi um dos atos mais corajosos, mas também mais libertadores de toda a minha vida. Aos poucos, fui me sentindo menos insegura com a decisão e aceitando que a vida dá voltas. É claro que estou optando por um caminho mais instável, mas não há por que criar tanta ansiedade em relação ao futuro. O que estou fazendo hoje é suficiente? Se sim, esse já é um ótimo primeiro passo.
Em prol de uma estabilidade, muitas vezes ilusória, abri mão das minhas vontades, agora, após tantas reviravoltas e reflexões, tenho certeza de como esse comportamento pode ser nocivo.
É claro que, às vezes, é preciso sim priorizar a estabilidade, mas o momento que vivo hoje me permite arriscar um pouco mais. E foi isso que eu fiz. Resolvi me arriscar como nunca antes, fui contra a maré. Nenhum dos meus amigos é freelancer, nenhum dos meus parentes é freelancer, é como se eu fosse pioneira nesse estilo de vida em meu círculo social.
Pela primeira vez na vida, eu me sinto confiante nas minhas escolhas, mas também preparada para lidar com qualquer imprevisto que possa cruzar o meu caminho. Os últimos anos no corporativo me tornaram uma pessoa mais madura, forte e me ajudaram a entender o que não quero para a minha vida.
O que eu quero? Por enquanto é viver de freela, mas pode ser que daqui a cinco anos isso mude e tome um novo rumo. Do que eu tenho certeza absoluta é que mais assustador do que abrir mão da estabilidade foi abrir mão dos meus sonhos por tanto tempo.
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