Quando o cartunista Laerte decidiu vestir-se de mulher e assumir essa identidade de cabeça erguida e peito aberto, certamente enfrentou críticas, comentários, acusações e diagnósticos sombrios sobre seu estado mental. Porém, acima de qualquer julgamento buscou ser fiel ao seu coração, ao que acredita de fato, àquilo que lhe traz paz mesmo causando turbulência à sua volta, uma reconciliação com sua história, um respeito por sua natureza.
Vivemos em busca de aprovação, de um olhar “superior”que nos diga que o caminho que trilhamos está certo, que é isso o que esperam de nós. Mas será que cumprindo o “combinado” nos tornamos pessoas mais felizes e realizadas?
Seria insano questionar o projeto e recalcular a rota?
De maneira similar, outro dia Xuxa deu um depoimento ao Fantástico onde mostrou um outro lado de sua história.
Rompeu o próprio silêncio e falou de um assunto delicado, quebrando talvez o código de conduta no qual uma “rainha” nunca deva expôr suas mazelas… Mostrou que por trás do “todo mundo tá feliz, tá feliz!!!”… também haviam dores, fantasmas, solidão_como todo mundo. Ao mostrar essa outra face fez como Laerte, que cansado de ser moldado às custas dos desejos alheios decidiu trilhar um caminho de transparência e assumir seu roteiro, mesmo chocando alguns e desagradando outros.
Desconstruindo a perfeição nos tornamos mais humanos, mais próximos uns dos outros.
Dando o grito de liberdade nos aceitamos como somos, nos perdoamos, deixamos de ter um olhar moralista sobre a identidade escondida dentro de nós, descobrimos que não somos culpados pela maioria das misérias à nós atribuídas. Enfim amadurecemos.
Amadurecemos quando nos libertamos da aprovação alheia para nos sentirmos felizes, confortáveis ou protegidos;
Quando deixamos de ter medo de nossas fragilidades e aceitamos olhar para elas do mesmo modo que nos vangloriamos de nossas virtudes;
Amadurecemos quando rompemos nossas defesas e nos descobrimos humildes, admitindo que ninguém é cem por cento imaculado, algumas enfermidades fazem parte do caminho e isso é perfeitamente aceitável;
Quando enfrentamos nossas provações de frente, não nos censuramos nem disfarçamos nosso inferno;
Amadurece quem não se vitimiza em busca de atenção, nem se omite pra manter sua reputação;
Amadurecemos quando aprendemos que a vida é composta de acertos e desacertos e nos permitimos errar. E depois de reparar nossas faltas, nos perdoamos e seguimos em frente;
Amadurecemos quando começamos a trilhar um caminho de transparência e fidelidade aos nossos sentimentos;
Quando preservamos nossa própria natureza, não poluímos a nós mesmos agindo de acordo com as “normas vigentes” nem aceitamos sermos rotulados;
Amadurecemos quando entendemos que somos os únicos responsáveis por nossas vidas e deixamos de culpar os outros por nossos fracassos, frustrações ou sonhos não realizados;
Quando entendemos que não adianta depositar nossas expectativas em ninguém, cada pessoa enxerga a vida à sua maneira e não é certo cobrar algo que tem valor relativo para cada um;
Amadurecemos quando deixamos de ter preconceitos contra nossa própria história, assumimos nossas imperfeições ou o que se fez imperfeito em nós e paramos de apontar no outro aquilo que tentamos esconder em nós;
Amadurecemos quando entendemos que a vida é um conjunto de bem e mal, certo e errado, belo e feio, alegrias e tristezas, e passamos a conviver bem com os dois lados, sem negociar uma escolha definitiva;
Amadurecemos quando deixamos de ser tão exigentes , quando nos permitimos transgredir e ser menos certinhos, quando finalmente aprendemos a dizer “não” e fo** – se!!!;
Amadurecemos quando descobrimos que a alegria verdadeira tem um antagonista dentro de nós, que ninguém é cem por cento feliz o tempo todo, e que isso é perfeitamente aceitável;
Amadurecemos quando percebemos que o sofrimento faz parte do caminho e que ele é bem vindo também, quando nos ensina o sentido da paciência e da aceitação diante das demoras e revezes da vida;
Amadurecemos quando compreendemos que não há lógica nem explicação pra tudo, que o importante é ter menos controle e mais diversão; quando percebemos que a maturidade flerta com a “INSANIDADE”…
Amadurece quem entende que a vida é como uma enorme colcha de retalhos em que os retalhos bonitos, limpos e de cores vivas estão firmemente atados aos retalhos feios, sujos e gastos pelo tempo. Certamente desejamos possuir e expôr uma colcha perfeita , agradável aos olhos e aconchegante. Mas para isso teríamos que mostrar apenas metade da colcha _ ou setenta por cento, vá lá.
Porém, quando entendemos que a beleza da colcha está no contraste entre o belo e o feio, o novo e o velho, o limpo e o sujo… encontramos a paz que deriva do perdão e da verdadeira auto estima. Deixamos de julgar tanto_a nós e aos outros_, relaxamos com nossas histórias, fazemos as pazes com nossos fantasmas.
Nos descobrimos livres, sem dívidas.
Encontra a felicidade aquele que entende que não adianta mostrar a colcha por partes nem camuflar os retalhos feios. O segredo é olhar para eles com carinho e aceitá-los como parte do todo. E conviver bem com isso, pois no final, usando a colcha inteira estaremos bem mais aquecidos do que se a usarmos só pela metade.
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