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O amor idealizado é fácil, mas o amor real exige trabalho e dedicação

Você acabou de sair de um último relacionamento, acredita que curou as feridas e decidiu passar um tempo sozinha, com o firme propósito de que, da próxima vez que se relacionar com alguém, vai fazer tudo diferente, e dessa vez viverá o que Cazuza cantou como “a sorte de um amor tranquilo, com sabor de fruta mordida…”

Renato Russo também disse um dia: “Quem inventou o amor, explica, por favor!” Ah, o amor, um dos assuntos mais pesquisados no Google, mais lamentados nos consultórios de Psicologia, mais discutidos nas rodas de amigas e também um dos que nos causam mais alegrias e nos mostram as dores que precisam ser cicatrizadas.

Costumo chamar esse “lugar” que os relacionamentos amorosos tocam como “caixa do afetivo”, e logo explico como essa expressão surgiu e o que ela significa.

A caixa do afetivo é o lugar onde os relacionamentos nos tocam

Como o amor ultrapassa qualquer nível de entendimento, eu e uma amiga, em nossos debates e trocas sobre relacionamentos amorosos, criamos uma expressão para nomear os comportamentos estranhos e sem nexo que nos assaltam quando o assunto é amor e relacionamentos: “a caixa do afetivo”.

Concluímos que podemos “tentar” entender os motivos que ligam uma pessoa a outra em um vínculo de amor e reciprocidade. Podemos também “tentar” traduzir em palavras, mas você efetivamente nunca saberá o que é o amor e a tal “caixa do afetivo” enquanto não os vivenciar.

Blaise Pascal sabiamente disse: “O coração tem razões que a própria razão desconhece.” Talvez, na prática, o amor esteja muito longe de qualquer explicação racional, de qualquer entendimento que passe pela lógica.

A caixa do afetivo e a caixa de pandora

Vamos supor que você tenha acabado de sair de um relacionamento e acredita ter-se curado das feridas passadas, decidiu passar um tempo sozinha, com o firme propósito de que, da próxima vez que se relacionar com alguém, vai fazer tudo diferente e, finalmente, viverá, como disse Cazuza, “a sorte de um amor tranquilo”.

Pois bem, depois de um tempo solteira, começam os encontros e você se sentindo “empoderada”, lógica, racional, equilibrada, com autoestima elevada, começa a se dar a oportunidade de conhecer possíveis candidatos a habitar seu coração. Enquanto ainda não fomos flechados pelo cupido, fica muito fácil olhar para os candidatos com um check list mental em mãos e fazer uma triagem que deixaria os profissionais de RH com inveja. Tudo parecerá sob controle, você se considerará forte, preparada e se achará pronta, e julgará saber tudo sobre o assunto.

O amor idealizado é fácil, mas o amor real, vivido fora da caixa, é difícil e dá trabalho

Tudo está sob controle até que alguém de fininho burla o processo seletivo, o check list some e, quando você se dá conta, já está com um sorriso bobo no rosto, sente-se um pouco mais ansiosa(o) à espera de um contato, uma aproximação, um convite e, quando estão juntos, parece que o paraíso desceu à Terra.

Mas, com o desenrolar da história, a aproximação do novo parceiro e todo o processo que acontece quando firmamos um novo relacionamento, sem que percebamos, a caixa do afetivo se abre e, quando entramos nela, algo estranho acontece: passamos a visitar lugares dentro de nós que nenhuma outra experiência nos faz alcançar.

Por meio dessas relações de profunda intimidade, revisitamos partes nossas que estavam esquecidas, adormecidas ou talvez nem as tivéssemos conhecido ainda. Nós nos deparamos com lugares de fragilidade e vulnerabilidade bastante assustadoras e desafiadoras no momento em que vamos avançando e escolhendo nos entregar.

Passado o encantamento inicial, o príncipe, a princesa e o cenário de filme desaparecem, entram em cena, descortinando toda a beleza inicial, as dores, os medos, as feridas ainda mal curadas que pensávamos estar cicatrizadas, as inseguranças, os nossos defeitos, os defeitos do outro… E é aí que o trabalho começa.

Atitudes e sentimentos que somente acionamos quando estamos nos entregando

Lugares de extrema profundidade são acionados dentro de nós, o que nos leva a ter atitudes e sentimentos com a pessoa amada que dificilmente temos em outras áreas da vida. Durante o processo de entrega ao amor, sentimentos profundos afloram, ora com grande carga emocional positiva, ora com grave intensidade, de maneira negativa.

Medos, angústias, ciúmes… são vivenciadas, lado a lado, a cumplicidade, a lealdade, a amizade… Quando percebemos que estamos amando, acessamos essa caixa do afetivo, e precisamos aprender a trabalhar emocionalmente tudo que vem dentro dela.

Dentro da caixa do afetivo parece existir uma lente de aumento

Fatos felizes são mais felizes. As dores machucam mais. A vulnerabilidade aumenta e a fragilidade também.

É nesse momento em que nos permitimos abrir a “caixa” que começa a sair de dentro dela, como referência, a “caixa de pandora”, tudo de podre que existe em nós, desde as nossas maiores dores e inseguranças até as sombras que tanto tememos e que estavam adormecidas. O outro nos serve como espelho para enxergarmos facetas nossas que até então gostaríamos de deixar escondidas.

Toda a nossa pose e empáfia de pessoas bem resolvidas vão pelo ralo e nos sentimos, em alguns momentos, como crianças feridas e assustadas, já que as relações de intimidade nos convidam a reviver sentimentos da infância, feridas que ainda não estão cicatrizadas, mas registradas em nosso inconsciente, geralmente associadas à história que tivemos com os nossos pais. Acabamos, assim, acionando comportamentos automáticos que mexem e remexem com nossos paradigmas, valores, tabus, dores e delícias.

Se você se identificou com tudo o que foi dito até aqui, você vive relacionamentos dentro da caixa

Os relacionamentos amorosos são instrumentos maravilhosos de autoconhecimento e podem nos ajudar a dar saltos quânticos em nossos processos evolutivos quando vivenciados de maneira madura, independentemente de quanto tempo durem.

A “caixa do afetivo”, as lembranças, dores, alegrias e dissabores podem nos ajudar a ser pessoas melhores, mais livres e integradas, mas para isso precisamos estar dispostos a aprender com tudo o que sair dela. Não é fácil, eu sei, e algumas pessoas precisarão de ajuda profissional, terapias para ressignificar os acontecimentos mais dolorosos.

Aprenda a viver um relacionamento fora da caixa

Acolha a caixa do afetivo, siga em frente e confie em que o correio eletrônico do Universo não erra. Preste atenção no conselho de Gal Costa em sua antiga “Chuva de Prata”: “Toda vez que o amor disser vem comigo, vai sem medo de se arrepender, você deve acreditar no que é lindo, pode ir fundo, isso é que viver…”

Todo relacionamento que nos aparece é uma bênção ou uma lição, saiba aprender tanto na dor quanto no amor. Talvez você receba exatamente o que estava precisando para poder alcançar outros níveis em sua jornada. Confie, entregue e deixe a vida fluir, pois as respostas virão no tempo certo!

Esqueça os relacionamentos perfeitos e ideais, seja você e construa o seu relacionamento com uma pessoa real, construindo, etapa por etapa, uma relação amorosa que seja a sua cara e traduza a sua verdade.

Gisele Lacorte

Psicóloga clínica, terapeuta corporal, consteladora familiar e orientadora profissional. Escritora e facilitadora de workshops, palestras e grupos terapêuticos que visam auxiliar as pessoas a reconhecer e ativar sua potencia de realização e alegria de viver através da reconexão com a sua verdadeira essência, do profundo cuidado com o sentir e com o poder de expressar suas emoções mais genuínas. Desenvolve trabalhos personalizados para grupos e empresas.

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