Todos nós desejamos a singularidade de existir, mas de uma maneira que não nos distancie das outras pessoas. De modo algum, na verdade, queremos destoar da humanidade comum.
Não queremos ser príncipes, ou princesas, confinados em castelos, queremos ser plebeus e viver no meio da plebe, mas com um toque de realeza nesse nosso jeito único de existir.

O príncipe Harry do Reino Unido está aí para provar. Sendo diferente, fez tudo igual a todo jovem do seu país. Recusou terminantemente o papel de príncipe que lhe foi atribuído, enfrentou a disciplina comum das academias militares, e foi para a guerra como um soldado qualquer.

Assim somos todos. Queremos ser únicos, desde que essa individualidade não nos faça diferentes, e essa aparente dicotomia entre dois paradigmas revela o que todos nós sabemos: que pertencer é a maior das necessidades humanas.

Toda criança, desde que nasce, deseja pertencer, inicialmente à família de origem, e depois a um grupo social que se amplia conforme o seu desenvolvimento.

É muito estranho quando uma criança não quer contato com outras crianças, quando ela não interage com os primos, ou com os coleguinhas da escola. Caso isso ocorra, os pais irão se preocupar e procurar ajuda especializada.

No entanto, conforme a vida se desenrola, algo oposto precisa acontecer: aquele jovem e aquela jovem cujo envolvimento social era marcado por uma forte presença, não demonstra mais o desejo de pertencer de forma tão efetiva.

Um dia, de repente, o comportamento de manada não lhe agrada mais. Ele desiste voluntariamente do lugar que conquistou no grupo social, e essa desistência não tem nada a ver com rebeldia, mas com algo intrínseco ao seu temperamento recém transformado.

Isso é bom ou é ruim? Isso não é bom e nem ruim, é apenas um jeito de existir diferente dos outros jeitos, mas que é altamente desejável para que possamos encontrar a nossa missão de vida. Quando ocorre, não nos afastamos da sociedade, mas servimos à sociedade com o nosso equipamento individualizado, o que nos faz mais úteis para Deus e para os homens.

C. S. Lewis, autor de vários livros cristãos, disse em seu livro “O Grande Abismo” que “não vivemos num mundo em que todas as estradas são raios de um círculo, e se seguidas por uma longa distância se aproximarão gradativamente para se encontrarem no centro. Na verdade vivemos num mundo em que toda estrada, depois de certa distância, se bifurca em duas, para em seguida, bifurcar-se novamente.”

O que Lewis está querendo nos ensinar é que a partir de uma determinada fase do caminho, é preciso fazer escolhas e dizer ao mundo dos iguais o que nos faz diferentes.

Seria muito estranho que na maturidade as pessoas fossem tão assemelhadas como o eram na adolescência. Seria inconveniente. Talvez até um pouco ridículo.

A vida não caminha em direção à unidade, mas em direção à diversidade.

Por isso, quando você se perceber diferente, trabalhe a favor da diferença e não contra ela. Não tente se moldar ao grupo de maneira a ser diluído nele, antes permita que o grupo absorva algo de você.

O que te faz diferente é a nota explicativa na pintura de um quadro abstrato.

Quando uma pessoa diferente avistar a pessoa diferente que você é, ambas as diferenças se explicarão. Mas, se uma delas esconder a sua diferença, impedirá que o outro a reconheça, escondendo a nota explicativa que jamais será decodificada.

Esse é um grande risco: que os diferentes sejam confundidos com os iguais. E que por causa do disfarce, toda a singularidade seja perdida no meio do rebanho.

Como disse C. S. Lewis no mesmo livro: “ À medida que crescem em perfeição, as criaturas vão se afastando cada vez mais umas das outras. O bem conforme amadurece, vai se tornando cada vez mais distinto, não apenas do mal, mas também de outro bem.”

Isso explica Madre Tereza de Calcutá, Irmã Dulce, e algumas outras raras criaturas, distintas tanto do mal quanto do bem comum.

Guardadas as devidas proporções, que as nossas singularidades sejam tão significativas que, no final da vida, possamos ter feito a diferença que apenas nós podemos fazer, no lugar que ocupamos no mundo.








Escritora compulsiva, descobri a minha vocação escrevendo cartas. Imaginei-me poeta e enviei para Adélia Prado alguns dos meus melhores poemas, pelo correio, juntamente com uma carta. Ela teve a gentileza de me retornar dizendo: “você escreve cartas admiráveis.” Entendi. Esqueci a poesia e passei a escrever cartas. Cada texto que escrevo é uma carta e o leitor é o destinatário dessa carta. Tem dado certo. Escrevo e assino. Com carinho, com afeto, e com as minhas experiências de vida.