– A gente tem que cuidar é do marido. Porque filho cresce e vai embora, vão cuidar da vida deles. O casamento fica e se você não cuidar, vai embora também. – Uma amiga me disse isso antes de eu me tornar mãe. Ela também não era mãe ainda, e eu concluí que éramos duas amadoras falando do que não sabíamos.

Hoje, aqui do alto de minha rasa experiência como mãe, mas suficiente para enxergar a vida de outro prisma, me peguei refletindo sobre essas palavras. Vi-me como filha. É engraçado como nossa percepção muda quando nos tornamos pais.

Quem nunca ouviu os pais dizendo: – “Quando você tiver filhos vai entender o que estou passando”? E quem nunca pensou em resposta: “Ai, nada a ver. Comigo vai ser diferente”. O fato é que não é. Certa estava a Elis Regina quando cantou “ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais”.

A vida é ciclo que se repete. E a maturidade que nos atinge como uma boxeadora cheia de experiência, também nos obriga a refletir em palavras que voltam à nossa memória assim, sem mais rodeios. Não mais que de repente você se recorda de uma conversa antiga, feito essa com a minha amiga falando que devemos cuidar mais do casamento que dos filhos.

Lembro-me de ter pensado naquela ocasião que isso era o mais completo absurdo. “Tem gente que não nasceu pra ser mãe” – pensei. Hoje, contudo, já não discordo mais dela. Não significa que eu não pense que os filhos são o que temos de mais valioso na vida. Sim, eles são. São nossa extensão, nossa real herança para o mundo. A perpetuação da nossa existência.

Os filhos são muitas coisas para os pais, no entanto, eles estão. Compreende? Não é difícil de entender. Pense em você enquanto filho. Independente de você ainda viver com o ou perto de seus pais, hoje você já faz suas próprias escolhas, das mais simples, como o que vestir, às mais complexas, como a escolha de um trabalho ou com quem se relacionar.

Seus pais devem ter a opinião deles quanto a como você deve viver sua vida. Você, por outro lado, é dono do seu destino e vai acatar conselhos que lhe forem convenientes. Do contrário, você lembrará aos seus pais que já é adulto (a) e sabe o que está fazendo. Talvez até se afaste deles, faça chacota das preocupações que eles transmitem, ache ridículas suas preocupações, exageradas, descabidas.

Do ponto de vista de filha, eu te entendo bem. É que já somos crescidos e sabemos nos cuidar muito bem. Exceto quando tudo parece dar errado e precisamos de um abrigo certo para nos proteger da vida. Não é? E do ponto de vista de mãe, eu penso em como os filhos são exatamente como já ouvi tantas vezes… “Do mundo”.

“Filho a gente cria pro mundo” – ouvia as pessoas dizendo. E hoje, só faço concordar com isso. Também eu fui para o mundo e deixei meus pais para trás, fazendo da vida esse ciclo que se repete. E quando assisto impotente o comportamento adolescente que se instala nos filhos, os momentos de rebeldia e uma luta implacável pela liberdade, como se viver com os pais lhes tolhesse esse direito ao mundo, percebo que os filhos estão e logo se vão.

Lembrei-me então da minha amiga dizendo que a gente tem que cuidar mesmo é do casamento, para ele estar sadio depois que os filhos partirem. E a danada tinha razão! Porque a gente passa a vida em torno dos filhos, os deixamos em nossa cama, conversamos pouco com nossos parceiros, deixamos os momentos a dois de lado e vivemos (especialmente as mães) aninhando os filhos debaixo das asas. Instinto maternal! E olha, eu acho que a gente tem que dengar mesmo, e dar amor, encher de carinho os nossos filhos, para que eles cresçam capazes de espalhar amor no mundo, sabendo receber e doar sentimentos bons.

Mas precisamos sim continuar a cuidar da relação. Porque os filhos crescem e começam a partir, aos poucos, sutilmente. Primeiro vem a escola e você já tem aquelas horas de silêncio na casa. Um silêncio pacífico e por vezes solitário. Se você perder o hábito de conversar com seu parceiro (ou parceira), quando esse silêncio chegar você não saberá o que fazer com ele. Serão apenas dois estranhos dividindo a mesma casa, mas não mais a mesma vida.

Precisamos sim cuidar permanentemente do nosso amor, do nosso par. Porque os filhos vão partindo lentamente, até que chega o namoro, a formatura, o casamento e por fim, nesse ciclo certeiro que é a vida, resta apenas o casal fazendo as mesmas coisas rotineiras, como preparar a refeição, ir ao supermercado, deitar na mesma casa e falar sobre a vida ou o dia, olhando para o teto.

Se você permitir que a presença dos filhos se sobreponha ao casamento, quando eles partirem para suas vidas (e vão partir, como você também partiu), você estará solitariamente acompanhado (a) por um estranho com decidiu viver todos os dias de sua vida.

É bem verdade que eu não tenho receita pronta para lidar com isso. Conheço casais que colocam os filhos acima de tudo, casais que deixam as crianças com os avós e viajam por semanas, casais que nem ligam para os filhos, casais que conciliam tudo, casais de todo o tipo. Mas não vivo a vida deles e quanto a minha, bem, como eu ia dizendo, não tenho receita pronta pra lidar com isso, nem receita por fazer. Receita nenhuma!

Fico feito um equilibrista tentando agir da melhor maneira. E nesse equilíbrio pensei que minha amiga tinha razão. Os filhos são nossa maior riqueza, mas são nossos apenas no nosso coração. Não nos pertencem. Um dia eles se vão.

Você vai ficar, vai envelhecer, vai precisar daquela mão dada, em passos lentos e camisas xadrez para dividir os dias que não precisam ser solitários. Mas pra chegar lá, suponho que a gente precise cuidar bem da relação, na mesma proporção e dedicação que cuidamos dos filhos.

Porque um dia os filhos se vão, mas o casamento permanece e precisa estar nutrido pra não morrer de desidratação. Os filhos são frutos. Nós somos raízes. Os frutos vão amadurecer e cair da árvore, ou serão arrancados às vezes ainda verdes. A árvore, no entanto, fica e precisa permanecer forte, mesmo que os frutos não estejam mais.








Sou mãe de um casal (lindo!), 35 anos, formada em Gestão Empresarial, gerencio uma Clínica Médica e escrevo por hobby e amor. Leonina de coração eternamente apaixonado, gosto de manter uma visão romântica sobre a vida. Humana, sou uma montanha russa de sentimentos e quando as palavras me sobram, escrevo. Minha alma deseja profundamente, um dia, apenas escrever