Afinal de contas, o que é superproteção?
Não podemos confundir proteção com superproteção. A proteção é saudável e vital aos filhos, enquanto a superproteção é algo danoso, pois superproteger é ir além da satisfação das necessidades e cuidados necessários.
Cuidados excessivos, se não dosados e equilibrados, podem virar uma síndrome obsessiva, o que pode afetar o relacionamento e o sistema familiar.
Desta forma, superproteger é viver pelo filho. É impossibilitar o seu próprio desenvolvimento, falar por ele, decidir por ele, solucionar os seus problemas.
É anular a sua autonomia, e de certa forma, aprisioná-lo em suas próprias escolhas, decisões e frustrações.
Podemos definir a superproteção como um movimento contrário à educação para a independência e liberdade.
A superproteção é uma privação da tentativa de acerto e também de erro. Assim como também, uma privação do crescimento, das escolhas e do desenvolvimento.
Obviamente, pais superprotetores estão cheios de boas intenções, mas superproteger os filhos é uma maneira brutal de paralisá-los.
Barrar o seu filho constantemente, privá-lo de qualquer frustração, não permitir que ele tente, faça e erre de vez quando, transmite pra ele a mensagem de que ele é incapaz, que não consegue, e que não é bom o suficiente.
E isso pode ser extremamente prejudicial, pois pode torná-lo demasiadamente inseguro.
Como saber se eu estou superprotegendo o meu filho?
Darei três exemplos de alguns comportamentos, e se você os replica, considero importante uma avaliação, com cautela, sobre eles.
1) Medo constante de que algo ruim vai acontecer ao seu filho
Muitos pais usam frases como: “o mundo anda tão perigoso”; “hoje em dia, todo cuidado é pouco”; “do jeito que as coisas estão, a gente precisa ter precaução”, para justificar uma preocupação e um medo constante e muitas vezes, desproporcional aos fatos.
É claro que você precisa cuidar e proteger o seu filho. Você não deve ser negligente, de forma alguma, porém também não pode querer controlar o seu filho, o tempo todo, sufocando-o e impedindo-o de crescer e de se desenvolver. Isso é obsessão.
Exemplo: Lucas* tem onze anos e sua turma irá fazer uma excursão de estudos para um museu em uma cidade vizinha. Os professores irão acompanhar os estudantes. Todos os seus colegas já confirmaram presença, e Lucas quer muito ir, porém seus pais o proíbem, pois consideram muito perigoso, e tem medo de que algo aconteça a ele.
Lucas insiste, pois a prova será sobre a experiência no Museu e valerá nota, mas os pais não mudam de ideia, e Lucas, será o único a ter que ficar em casa.
Lucas nunca pôde ir a nenhuma excursão da escola, nem tampouco em aniversários ou na casa dos amigos.
Neste caso, os pais, por querer controlá-lo e por medo, acabam prejudicando Lucas de várias formas, pois além de ser prejudicado na escola, ele acaba sendo excluído, o que afeta e muito a sua vida, o seu desenvolvimento pessoal e as suas relações.
2) Tratar o seu filho de uma forma que não corresponde com a sua idade
Quando o seu filho é um bebê, ele necessita totalmente de seus cuidados para sobreviver. Ou seja, ele não tem autonomia, ele é uma extensão de você. É você que alimenta, dá banho e cuida das suas necessidades básicas.
Conforme ele vai crescendo, ele vai se desvinculando de você e vai se reconhecendo e aprendendo a se colocar e a se impor como indivíduo no mundo.
É natural, que conforme os anos passem, ele obtenha, gradativamente, autonomia. Autonomia para escolher, decidir e se responsabilizar.
Na superproteção, esse desenvolvimento da autonomia não acontece. É comum ver pais que infantilizam os filhos, e isso pode ser visto em situações como:
• Modo de falar – Muitas vezes os pais falam de maneira infantilizada, ou seja, falam com o filho como se ele ainda fosse um bebê. Fazem vozinhas de criança ou usam palavras erradas, propositalmente.
Exemplo: “Amozi da mamãe, vem ati com a mamãe” – que significa: “Amor da mamãe, vem aqui com a mamãe”.
• Ações – Os pais não permitem que o filho execute determinadas tarefas sozinho, sendo que ele já tem idade e aptidão suficiente para resolvê-las.
Exemplo: João* tem quinze anos e sua mãe o leva para a escola, todos os dias. Ele já tem idade suficiente para atravessar a rua e ir para a sala de aula sozinho, mas a sua mãe insiste em acompanhá-lo até a porta da sua sala, pois é demasiadamente preocupada com a sua segurança.
3) Medo excessivo de que o seu filho se machuque brincando
As crianças precisam brincar. Muitas vezes, inclusive, é através da brincadeira, que elas se relacionam com o mundo.
Porém, em algum momento, elas irão se machucar. E isso é completamente normal. Um arranhão daqui, um joelho roxo dali, são coisas absolutamente esperáveis de uma criança. E isso não é o fim do mundo!
É claro que os pais precisam estar atentos e devem estipular locais, horários e espaços para a brincadeira das crianças, e dependendo da idade, é muito importante que tudo isso seja feito com a vistoria de um adulto, porém não dá pra exagerar nas medidas preventivas e nos cuidados exagerados.
Não dá pra isolar a criança em uma bolha, é saudável que ela tenha contato com outras crianças e também com outros espaços e objetos.
Você quer um exemplo disso? Eu!
Quando eu era criança, eu vivia com os meus joelhos roxos. Eu caía de roller, de bicicleta e às vezes, caia por nada! Eu gostava de me aventurar, de correr e de explorar.
Tenho cicatrizes até hoje em meus joelhos que me rendem boas memórias e adivinhem: eu ainda estou aqui!
Crianças são cientistas – Permita-as explorar e questionar!
Além do amor incondicional dos pais, do carinho e atenção, as crianças necessitam de critérios claros e consequências para os seus atos.
As crianças precisam de limites. Eles influenciam na tomada de decisões, e delimitam o que é direito delas, e o que é direito dos outros. Eles estabelecem uma barreira, do que pode e do que não deve ser feito.
As crianças precisam, gradativamente, ter a liberdade de fazer as coisas por si mesmas, de resolver os seus próprios problemas e arcar com as consequências de seus próprios atos. Isso fará com que elas cresçam mais seguras e desenvolvam a capacidade de aprender a partir de suas próprias vivências, inclusive com os seus próprios erros.
Se os pais não permitem que a criança se responsabilize por seus próprios atos e tenha a liberdade de agir e errar, ou seja, se eles sempre resolvem os seus problemas ou acabam interferindo para que a criança não sofra a consequência de seus próprios atos, na verdade, eles não estão ajudando. Ao contrário, estão atrapalhando e atrasando o seu desenvolvimento e amadurecimento.
Darei um exemplo: Chanel* não gosta de fazer os deveres de casa, e para que ela não seja punida na escola, a mãe acaba fazendo os seus deveres. Neste caso, a mãe não está permitindo que a filha arque com as consequências de seus atos para que ela não sofra nenhum dano e não tenha nenhuma punição.
A mãe de Chanel* não está a ajudando. Pode ser que esteja ajudando se analisarmos as tarefas como algo isolado, mas não no que se refere ao contexto, em si.
O que a mãe está fazendo, nada mais é do que reforçar a irresponsabilidade da filha, o que em longo prazo, pode ter consequências desastrosas.
Crianças precisam aprender a ser responsáveis e também a lidar com a frustração de precisar fazer o que não gostam. Elas não devem (e não podem) fazer só o que gostam ou só o que querem, simplesmente porque são crianças.
Crianças sem limites são adultos sem limites.
Não despeje as suas frustrações no seu filho – Permita que ele seja imperfeito!
Seu filho não é o melhor. Ele não é o mais bonito, o mais inteligente e nem o mais talentoso. Ele provavelmente não é um gênio, e muito menos, um filho perfeito.
E por mais que você o veja desta forma, o mundo não o verá com olhos tão amorosos e admirados quanto os seus – e ao invés de bajulá-lo, você precisa amá-lo e ensiná-lo a lidar com isso, a trabalhar, aceitar e conseguir enxergar os seus pontos fracos, assim como também a impulsionar os seus pontos fortes.
Nem sempre ele será o destaque, e por mais que você faça tudo o que estiver ao seu alcance, por mais que você o eduque e lhe dê amor e amparo, ele vai errar. Ele vai falhar e vai te desapontar. E você precisa aprender a lidar com isso.
Você não pode se sentir culpado pelas falhas e fracassos do seu filho. Não deve se punir mentalmente e nem se culpar quando o seu filho erra. O erro faz parte do processo, do aprendizado e desenvolvimento.
Os erros deles não são seus. A falha não é sua. Permita que ele se responsabilize!
Eu tenho certeza, que ao longo da sua vida, você aprendeu muito com os seus erros, certo?
Inclusive talvez mais do que com os próprios acertos. Permita que o seu filho também erre e aprenda com as suas próprias escolhas. Permita que ele mesmo trace o seu caminho!
Ande ao lado dele, mas não na frente. Permita que ele escolha o seu caminho. Estenda a sua mão, mas com a suavidade do amparo e não com a brutalidade de anulação do poder de escolha de sua própria trajetória.
Dar tudo o que você não teve para o seu filho, pode ser severamente danoso!
Quantas vezes você já ouviu algum pai dizendo que quer dar tudo o que ele não teve, para o seu filho? Eu muitas.
Obviamente está explícito na fala de pais que replicam esta frase, vários tipos de falta. E por terem uma falta, querem compensar com a presença (física, financeira, etc) na vida do filho. Porém se não dosada, essa presença pode ser “esmagadora”.
A superproteção entra aí, muitas vezes, como uma forma de suprir essa falta. E é aí que reside o problema. Pais superprotetores são pais controladores.
Superproteção é um excesso de proteção. E o excesso sufoca.
Filhos de pais superprotetores frequentemente se tornam inseguros, inquietos ou introspectivos demais, medrosos, com dificuldade de socialização, revoltados ou agressivos.
É fundamental dar suporte, apoio, carinho e condições favoráveis para o seu filho, porém controlar ele demais, invadir o seu espaço e tomar decisões por ele, além de causar danos diretos, muitas vezes, o distancia da família (física ou emocionalmente).
Tudo isso pode ser evitado com uma proteção cuidadosa, mas equilibrada. Sem o peso de você ter que dar tudo o que não teve, porque talvez as necessidades dele sejam outras. Sem o peso de ele ser o que você não conseguiu ser, ou chegar ao lugar aonde você não chegou. Sem culpa. Sem controle exagerado. Sem obsessão.
*P.S.: Seu filho não é uma extensão de você e ele não precisa realizar os seus sonhos ou os seus desejos.
*P.S. 2: Todos os nomes e exemplos dados são fictícios.
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