Que há ligação entre problemas de saúde mental e redes sociais já é sabido, e acredito que nem preciso citar fonte alguma para te comprovar isso. Mas, devo discordar da forma como a maioria dessas pesquisas são divulgadas por aí: sempre culpabilizando as redes, seus conteúdos, algoritmos e etc.
Costumamos terminar de ler essas matérias pensando “Okay, eu definitivamente preciso deletar todas as minhas contas agora mesmo. Já!”. Quando, na verdade, deveríamos estar pensando em ressignificar nossa relação com elas e com nossa própria vida.
Segundo matéria na UOL TAB, é tendência o movimento de jovens saindo das redes sociais para nunca mais voltarem. Em estudo, 63% de estudantes de colégios britânicos afirmaram, inclusive, que ficariam felizes se elas nunca tivessem sido inventadas. Eu mesma já me senti assim. Hoje, o que vejo é um movimento de negação da nossa autorresponsabilidade com nossos próprios vícios e alegrias.
Ou você vê uma porcentagem dessa por aí dizendo que as grandes marcas de fastfood, roupas, bebidas, carros, medicamentos e mais, também objetos de consumo exagerado e referenciados na animação de Steve Cutts, não deveriam existir?
Nativa digital que sou, eu não tinha nem 4 anos quando o Orkut nasceu, e o MSN veio 5 anos antes de mim.
Jamais conheci um mundo isento de internet, portanto, minha relação com as mídias começou desde cedo. Aos 10 anos, cheguei a dar entrevista para a revista ProXXIma sobre a geração Z e a tecnologia. Ainda na infância/pré-adolescência, me tornei “a louca da selfie” e dos jogos online como Stardoll, Club Penguin e Habbo.
Tive uma adolescência regada a likes, memes, tweets, posts e afins. Meu pai desligava o Wi-Fi para eu dormir, e eu podia virar noites jogando o simulador de vida The Sims 3, “vivendo” uma realidade alternativa na qual eu podia ser feliz sem a comparação que eu mesma fazia de mim com o outro, da minha com a vida alheia (dentro ou fora da internet).
Até que, em Junho de 2019, eu terminei com o Facebook e o Instagram e pedi um tempo para o LinkedIn. Por cerca de 4 meses, me tornei “a louca do detox digital”. Se entrava em alguma das três era para procurar ou avaliar algo muito específico como os trabalhos de um salão de beleza, por exemplo, e sair logo depois. “Nada de ficar rolando feed e perdendo seu precioso tempo com algo tão improdutivo e tóxico, mocinha”.
E eu realmente me sentia mais reflexiva, produtiva, leve, feliz sem tanta informação.
Porém, será mesmo que a culpa da minha falta de produtividade e dos meus problemas de saúde mental era das mídias sociais digitais? Ou será que era (e ainda é) a minha própria falta de autoconfiança para ter controle, disciplina e rotina?
“Vamos jogar a real aqui? Esse não é o problema de 99% das pessoas. A grande maioria procrastina porque simplesmente tem baixa autoestima e autoconfiança e não CONSEGUE fazer o que gostaria! É mais fácil se esconder atrás deste status do que entender que você foge das suas obrigações porque não tem coragem de avançar na sua própria vida. Avançar na vida significa crescer e ficar exposto. E se você falhar? E se te julgarem? Melhor continuar quieto num canto escuro” (Alexandre Formagio, facilitador e palestrante em desenvolvimento pessoal, em publicação no Instagram).
O meu, o seu, o nosso problema não é a preguiça ou a procrastinação das coisas, não é a desmotivação ou a ausência de força de vontade. É a insegurança e a incapacidade de olhar verdadeiramente para si a para o outro, para a própria e para a vida alheia. Supostamente, todos esses problemas são provenientes, em boa parte, das redes. Permita-me destruir essa crença generalizada. E veja como a perspectiva muda quando nem tudo (aliás, nada) é uma competição de quem é mais feliz e produtivo.
Um dia, eu abri o Instagram e decidi não me comparar. Escolhi passar pelas publicações das pessoas e enxergar além do meu próprio umbigo. Me tirei da história e coloquei a intenção de aprender a ficar feliz pelos outros. Não são pessoas curtindo uma festa, uma viagem, um jantar, um show enquanto eu estou deitada deslizando o dedão numa tela. São apenas pessoas curtindo uma festa, uma viagem, um jantar, um show. Ponto.
Você está no comando de suas ações e emoções. As redes sociais são apenas ferramentas.
“Redes sociais geram ansiedade e depressão em jovens brasileiros, diz estudo” é o título de uma das matérias que aparecem na primeira página quando digitamos o termo “redes sociais e depressão” no Google.
Não, queridos veículos jornalísticos e midiáticos, nós e nossa cabecinha maligna, doutrinada e domesticada direitinho ao longo dos anos, somos nossos próprios inimigos e vilões. Nós criamos e geramos a realidade que quisermos com nossa mente e, infelizmente, costumamos escolher as piores imagináveis, recheadas de culpa, vergonha, medo, julgamento.
Em seu livro “Os Quatro Compromissos – Um Guia Prático Para A Liberdade Pessoal”, o autor mexicano de textos espiritualistas e neoshamanísticos toltecas, Don Miguel Ruiz escreveu:
“Treinamos nossos filhos, a quem tanto amamos, da mesma forma que treinamos qualquer animal doméstico: a partir de um sistema de castigos e recompensas. […] Fomos castigados e recompensados muitas vezes ao longo dos dias. […] Somos tão bem-treinados que passamos a ser nosso próprio treinador. Somos um animal autodomesticado. Agora podemos domesticar a nós mesmos […] usando as mesmas técnicas de punição e recompensa”.
Aqui, cabe outra animação ainda mais abrangente. No primeiro minuto de vídeo, IN-SHADOW apresenta uma Terra quadrada, mostrando questões de domesticação e treinamento, com caixas nas cabeças e máscaras nos rostos das pessoas. Essas analogias são presentes durante todo o curta, tratando também o trabalho, o consumismo, as relações, as mídias e muitos outros. Até o momento em que tudo isso começa a morrer para um renascer da humanidade. Confira:
Viva aquilo que você mostra, e vice-versa. Se a vida real não é perfeita, por que a virtual tem de parecer?
“Não quero deixar que minha saúde mental seja abalada por ter que bater de frente com culturas instagramáveis e realidades opostas” (Eleonora Romão, analista de marketing e mídias sociais, em publicação no LinkedIn).
Pois bem, para além de ser a favor de uma visão mais gentil com o que o outro publica, também acredito que devemos promover publicações mais gentis a visão alheia. Em meu último artigo, contei sobre minha viagem de final de ano com detalhes positivos e negativos.
Fiz isso, porque, após ter chegado aos dois extremos (do vício a indiferença), fui voltando a publicar aos poucos e cheguei ao meio-termo. Percebi que, como tudo na vida, há benefícios no uso consciente das redes sociais. Não acho que devemos abandoná-las, apenas torná-las mais reais. Assim, vulneráveis, nos sentimos e fazemos os outros se sentirem menos sós.
Sem contar que, a partir da consciência de um olhar realista e gentil para a vida, passamos a curtí-la como ela é e precisa ser. Assim mesmo, imperfeita e cheia de aprendizados. Entendemos o erro, a falha como algo que faz parte e nos arriscamos, desafiamos mais. Como eu escolhi me jogar na faculdade para melhorar, por exemplo, minha autoconfiança. Curtimos a minha, a sua, a dele, a dela… A vida de todo mundo. JUNTOS.
De nada adianta uma vida “instagramável” se ela não é curtida em tempo real, no agora. Viva o presente. Sorria, de verdade, não para a selfie. E aí sim tire a foto mesmo assim hahaha. Tenha autorresponsabilidade e responsabilidade afetiva. Vamos juntos, juntas?! {♡}
Artigo Publicado em Lana Bella