Por: Drake Baer
A depressão está por toda parte: em 2015, cerca de 16 milhões – ou 6,7% – dos adultos americanos tiveram um episódio depressivo relevante no ano passado. A depressão é responsável pela perda de anos de vida e pode representar anos de convivência com incapacitações mentais ou problemas de comportamento.
Ela também custa caro: entre 1999 e 2012, a porcentagem de americanos tomando antidepressivos aumentou de estimados 6,8% para 12%. O mercado global de remédios para depressão deve atingir mais de 16 bilhões de dólares até 2020.
O Instituto Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos define um episódio depressivo relevante como “um período de duas semanas ou mais durante o qual há humor deprimido ou perda de interesse ou prazer, e pelo menos outros quatro sintomas que refletem uma mudança no funcionamento, tais como problemas de sono, apetite, energia, concentração e a autoimagem”.
Isso está de acordo com o que Matthew Hutson, em um novo artigo para a Nautilus, descreve como o modelo da depressão: que a depressão é “uma ruptura, uma falha no sistema, algo a ser remediado e superado”.
No artigo, atraente e desafiador, Hutson traça o perfil de vários pesquisadores que propõem que a depressão possa desempenhar um papel positivo do ponto de vista da evolução. Mas, em vez de deificar a evolução e tentar destrinchar o que ela significa para nós, vamos nos concentrar no que é mais imediatamente útil para nossas vidas de hoje: em algumas circunstâncias, a depressão pode trazer, no arco de uma vida, insights e significados pessoais. Tudo isso não quer dizer que o sofrimento causado pela depressão deva ser minimizado – mas sim que ele possa ter alguma utilidade.
No centro do artigo de Hutson está Paul Andrews, psicólogo evolucionista da Universidade McMaster, no Canadá. Andrews argumenta que a depressão pode ser uma “adaptação para analisar problemas complexos”.
Ele enxerga isso nos vários sintomas da doença, que incluem anedonia, ou a incapacidade de sentir prazer; a constante ruminação; e o fato de que as pessoas deprimidas passam mais tempo nas fases profundas do sono, que são associadas à consolidação da memória. Isso reflete um design evolutivo, diz o argumento, que “nos afasta das experiências normais da vida e nos concentra no entendimento ou na resolução do problema que motivou o episódio depressivo”, como resume Hutson. Como um relacionamento “fracassado”, por exemplo. O episódio, então, é uma espécie de estado alterado, diferente do ritmo do dia-a-dia e que deveria fazer você prestar atenção ao que te deixou deprimido.
Por exemplo, um estudo com 61 pessoas indicou que 80% dos participantes viam algum tipo de benefício na ruminação, em geral avaliando os problemas e evitando erros futuros.
Por enquanto, a “hipótese da ruminação analítica” é somente isso, uma hipótese, termo que combina os termos gregos hipo (sob) e thesis (colocação). É um conceito, uma observação que serve de estrutura para mais investigações.
Ainda assim, há algo muito poderoso em reconceituar (alguns) episódios depressivos como algo útil. Outra pesquisa ajuda a entender o que estamos dizendo.
Laura King, psicóloga da Universidade do Missouri, passou um par de décadas estudando as experiências da pessoas em relação ao sentido da vida. Em uma entrevista, ela me disse que o sentido que as pessoas extraem de experiências difíceis depende não só do quanto elas sofreram, mas também do tempo de reflexão posterior. Seguindo essa lógica, se a função de um episódio depressivo é entender o que deu errado, que nós emocionais precisam ser desfeitos, que padrões de afeto precisam ser identificados e atacados, então os antidepressivos são um tratamento incompleto, assim como você não receitaria um analgésico para curar uma fratura do tornozelo sem antes engessar a área.
Existem outras questões estruturais maiores em torno da cultura e da indústria da saúde mental. Se a cura da depressão não requer apenas o alívio dos sintomas, mas retrabalhar os padrões psicológicos da pessoa, trata-se de um processo profundamente subjetivo, não objetivo, o que significa que o método científico pode ter dificuldade em acessar esses padrões. Além disso, a terapia – seja comportamental ou psicanalítica – exigem muito dinheiro e muito tempo e não, para dizer o mínimo, coberta por muitos planos de saúde nos Estados Unidos.
Ainda assim, enquadrar a depressão como um espaço para a reflexão é empoderador e confere um certo grau de agência para a pessoa que se sente pressionada. Como a ansiedade, a depressão pode querer estar te comunicando alguma coisa. A linguagem das tradições terapêuticas é útil: um analista jungiano descreveria a depressão como katabasis, um termo do grego antigo que significa descida. Como Orfeu buscando Hades ou Luke Skywalker nos pântanos de Dagobah, é uma viagem para o submundo, e a aventura é “atravessar a porta… mergulhar na ferida e sair da vida antiga por ela”, como escreve Robert Bly em Iron John.
Como são subjetivos, os problemas e soluções serão pessoais – da pessoa e de sua história psicológica particular – e portanto exigem a compreensão individualizada de quem está sofrendo da depressão, talvez com a ajuda de um terapeuta hábil. E há outro tema: enquanto o desengajamento das emoções caracteriza a depressão e outros transtornos, o engajamento com o mundo interior parece ser a saída. Dizendo de forma mais poética: você sai pela ferida.
“A maioria dos episódios de depressão terminam sozinhos – algo conhecido como remissão espontânea”, diz Steven Hollon, psicólogo da Universidade Vanderbilt, à Nautilus. Ele nota que a narrativa da depressão como adaptação pode explicar o porquê. De fato, “terapias comportamentais cognitivas e de resolução de problemas podem funcionar justamente por que tocam e aceleram – em semanas – justamente os processos que evoluíram para acontecer ao longo de meses”, acrescenta ele. Katabasis leva à catarse; não é coincidência que existe um tema compartilhado nas narrativas pessoais de quem atingiu a meia-idade com um senso de bem estar e de generosidade em relação aos outros: redenção.
TEXTO ORIGINAL DE BRASILPOST
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