Então, aquela história bonita começa a ficar apenas na história e a realidade, distorcida pelo desgaste diário, começa a transformar amor em desamor, a transformar carinho em cobranças, em tempo, em desculpas; afeto em desafeto e o medo de perder em dúvida do desistir.

Recentemente, o meu celular deu um problema e eu resolvi levá-lo à assistência. Depois de alguns dias, tive o retorno de que o problema era a bateria e que isso me custaria nada menos do que 120,00 reais.

O meu aparelho celular já estava há um bom tempo comigo. E, como tudo que é tecnológico, já estava ultrapassado. Muita gente tentou me convencer de que não valeria a pena consertá-lo e que eu poderia comprar um novo por um preço legal. Assim, eu não precisaria esperar e teria algo aparentemente muito “melhor” em minhas mãos.

Mas eu hesitei, até pensei na possibilidade, mas hesitei. Pensei em sua câmera boa, na imagem de qualidade, pensei no preço que eu pagara quando o comprei e que, embora ele fosse “ultrapassado” em questão de tecnologia, seria tão mais fácil desistir e comprar outro para substituí-lo, mas ele era suficientemente bom para mim. Enfim, eu gostava dele e a decisão estava tomada. O aparelho ficou cerca de um mês na assistência. A espera não foi fácil.

Enquanto relatava isso para uma amiga, pensei na questão dos relacionamentos nos dias atuais. É mais fácil desistir na primeira briga do que enfrentar os desencontros e insistir um pouco mais. É mais fácil procurar o que está fora do que reacender o que está ali, bem à nossa frente.

Relacionamento não é nem de longe uma tarefa fácil. Manter o amor vivo dentro de nós e transbordar isso em nossa relação com o outro é, muitas vezes, uma tarefa que exige de nós paciência, mesmo quando o dia está cansativo e a gente não consegue olhar para o outro com compaixão.

Depois de um tempo, o riso fácil não aparece assim tão facilmente; o cansaço, as contas, e o dia a dia sugam-nos na rotina e, consequentemente, o tempo dedicado ao outro fica mais escasso. A monotonia toma conta de nossas vidas, ditando os nossos compromissos e as nossas prioridades. Suga toda a nossa energia e, no final do dia, a gente não quer nem conversar. O diálogo vai ficando para trás e cede lugar a cobranças incessantes e à irritação.

Então, aquela história bonita começa a ficar apenas na história e a realidade, distorcida pelo desgaste diário, começa a transformar amor em desamor, a transformar carinho em cobranças, em tempo, em desculpas; afeto em desafeto e o medo de perder em dúvida do desistir.

Assim como o meu celular que, depois de tantas selfies bonitas com sorriso escancarado, mensagens trocadas, ligações feitas na madrugada, precisou de um “conserto”, alguns relacionamentos não precisam de um fim, mas de um recomeço. Eu poderia ter deixado de lado, mas me lembrei do quanto ele me custou quando o comprei, do parcelamento em 12 vezes sem juros e do esforço que fiz para poder pagá-lo. Eu me lembrei das coisas boas que ele tinha e que não valeria a pena trocá-lo por algo mais “atualizado”.

Todo casal, quando percebe que o amor está morrendo por conta da rotina, do cansaço, do excesso de trabalho, que enterra falas de carinho e de saudade, deveria se lembrar de todos os motivos que o levou a se apaixonar um pelo outro. É mais fácil, muitas vezes, descartar do que reacender a chama. É mais fácil ignorar, deixar para trás e tentar encontrar algo novo, de novo. É difícil insistir, porque isso exige de nós paciência para ter o outro e a relação inteiros novamente.
Talvez o seu parceiro esteja tão exausto quanto você, tão cansado e sobrecarregado quanto você. Talvez os jantares tenham ficado apenas no começo do relacionamento, os gestos de carinho, o beijo na testa e as despedidas com um beijo tenham cedido lugar a gestos frios que mais remetem a uma amizade do que ao desejo e à saudade.

Talvez, no final do dia, depois de tanto tempo, não vejam a necessidade de dizer eu te amo, de prepararem um jantar a dois em casa mesmo, com aquela omelete que remete à simplicidade e que expõe o carinho dedicado no preparo daquela comida. A gente, depois de um tempo, esquece-se de elogiar o pijama, de dar o beijo de boa noite, esquece-se daquele olhar sincero que nos dava paz lá no começo de tudo. Daquele abraço aconchegante em que nos achegávamos sempre e do sorriso que nos irradiava. Esquecemo-nos do brilho do outro e de como ela fica linda com aquele vestido azul. Esquecemo-nos do começo e fitamos os nossos olhos no fim, acreditando ser mais fácil deixar para trás do que mover essa história para a frente.

Esquecemo-nos daquilo que nos fez apaixonar pelo outro e que, embora o tempo transforme tudo, de algum modo, o sorriso, o abraço, o toque, a simplicidade e até aqueles defeitinhos continuam ali, camuflados pelo cansaço e por achar que o outro não repara mais em nós. Mesmo com todas as mudanças do outro, esquecemo-nos de elogiar o novo e de reparar na pessoa incrível que aquela pessoa apaixonante ao nosso lado tem se tornado e se esforçado para ser melhor a cada dia. O corte de cabelo, o estilo da roupa, os planos, as metas, os sonhos mudam, mas aquela pessoa de sorriso tímido continua ali, esperando um abraço seu. Insistimos em ver aquilo que quer morrer e não reparamos naquilo que insiste em reacender: o amor.

Vale a pena investir naquilo que nos faz bem e que está enterrado pela falta de tempo, pela rotina e pela sobrecarga de inúmeras coisas a serem feitas em 24 horas. É difícil, depois de um tempo, arrumar espaço para uma ligação qualquer, quando se tem que escolher entre dormir ou terminar o seu trabalho da faculdade; quando temos que escolher planejar um jantar ou planejar as atividades da semana.

Amar exige de nós dedicação, mas é uma reciprocidade tão boa, que vale a pena investir naquilo que não se perde, que não se esgota. Vale a pena investir em alguém que desperta o nosso melhor, que sabe ser uma boa companhia. Vale a pena reacender a chama, reviver e recomeçar uma história de amor com a mesma pessoa.
Portanto, não se esqueça da magia do primeiro beijo desajeitado, do primeiro abraço, das tardes de domingo e do primeiro encontro. Porque, apesar dos desencontros, há sempre uma chance de recomeçar.








Estudante de psicologia, apaixonada por artes, música e poesia. Não dispensa um sorvete e adora um pastel de feira com muito requeijão, mesmo sendo intolerante a lactose. Tem pavor de borboletas, principalmente as no estômago.